A Polícia Federal (PF) desencadeou, nesta terça-feira (16), uma grande operação para combater um sofisticado esquema de corrupção, lavagem de dinheiro e desvio de verbas do Sistema Único de Saúde (SUS) no estado de Alagoas. Batizada de Operação Estágio IV, a ação investiga um prejuízo estimado em quase R$ 100 milhões aos cofres públicos.
Mandados cumpridos em três estados e afastamento de servidor
Durante a operação, foram cumpridos 38 mandados de busca e apreensão, expedidos pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5). As diligências ocorreram em endereços localizados em Alagoas, Pernambuco e no Distrito Federal. Como uma das primeiras consequências, um servidor público estadual foi afastado por 180 dias de suas funções. O TRF-5 também determinou o sequestro de bens dos investigados, incluindo veículos e imóveis de alto valor.
A força-tarefa mobilizou 170 policiais federais e 26 auditores, contando com o apoio estratégico da Controladoria-Geral da União (CGU), da Receita Federal e do Departamento Nacional de Auditoria do SUS (Denasus).
Duas frentes de desvio: contratos e ressarcimentos fraudulentos
As investigações apontam duas principais modalidades de desvio. A primeira envolve contratos emergenciais celebrados pela Secretaria de Estado da Saúde (Sesau) entre 2023 e 2025. A PF identificou indícios de favorecimento em licitações diretas com uma fornecedora de material hospitalar e uma construtora, que juntas somam cerca de R$ 100 milhões. Grande parte desses recursos ainda estava em fase de execução.
A segunda frente, já consumada, revela um desvio de mais de R$ 18 milhões. O montante foi subtraído por meio de ressarcimentos superfaturados à rede privada por consultas e procedimentos médicos que, segundo as provas colhidas, não teriam sido realizados. Esses pagamentos indevidos foram efetuados pela Sesau entre setembro de 2023 e agosto de 2025.
Um caso emblemático citado pelos investigadores é o de uma clínica de fisioterapia que recebeu valores incompatíveis com sua capacidade operacional real, levantando fortes suspeitas de fraude.
Lavagem de dinheiro e aquisição de luxo
O dinheiro desviado era inserido no circuito financeiro dos investigados por meio de transferências bancárias, saques em espécie e pagamentos indiretos. Para ocultar a origem ilícita dos valores, principalmente na compra de imóveis, o grupo utilizava "laranjas" (interpostas pessoas).
O inquérito já identificou que propriedades adquiridas pelo esquema foram registradas em nome de familiares e terceiros. Destaque para uma pousada em Porto de Pedras, no Litoral Norte de Alagoas, comprada em 2023 pelo valor de R$ 5,7 milhões, supostamente paga por empresários beneficiados pelas fraudes. Os recursos públicos também eram usados para custear viagens internacionais e gastos pessoais de luxo.
Durante as buscas, a PF apreendeu uma grande quantidade de dinheiro em espécie, em real e moeda estrangeira, além de duas armas de fogo.
Reação do governo e simbolismo da operação
Em nota oficial, o Governo de Alagoas, por meio da Secretaria de Comunicação (Secom), informou que o governador Paulo Dantas determinou a criação de uma comissão especial para acompanhar e colaborar com as investigações. O grupo será composto pelo Gabinete Civil, Controladoria-Geral do Estado e Procuradoria-Geral do Estado.
A nota reafirma que o governo "não compactua com qualquer tipo de irregularidade" e garante "colaboração total, transparente e irrestrita" com a PF e o Ministério Público. A Sesau informou que todas as suas atividades seguem normalmente, sem interrupção no atendimento à população.
O nome "Estágio IV" foi escolhido pela Polícia Federal para simbolizar a gravidade do caso. A referência é ao estágio terminal de alguns tipos de câncer, uma alusão direta à nocividade e ao caráter devastador que as ações da organização criminosa representavam para o sistema público de saúde alagoano.