A inauguração da primeira loja física da Shein em Paris tornou-se um evento marcado por contradições. Enquanto uma multidão de consumidores aguardava ansiosamente pela abertura, protestos ecoavam do lado de fora, revelando a relação de amor e ódio que a marca desperta na Europa.
O Tsunami de Pacotes Chineses na Europa
Os números revelam uma realidade impressionante: 4,6 bilhões de itens de baixo valor foram importados para a União Europeia em 2024, segundo relatório da Comissão Executiva do bloco. Este volume representa o dobro do registrado em 2023 e mais que o triplo de 2022.
Deste total, 91% dos 12 milhões de pacotes que chegam diariamente à UE têm origem chinesa. Embora nem todos sejam exclusivamente da Shein e Temu, juntas essas plataformas dominam significativa fatia deste mercado.
Agustin Reyna, diretor-geral da Organização Europeia de Consumidores (BEUC), alerta: "A Europa está sendo inundada por um tsunami de pequenos pacotes vindos da China, e isso não vai parar tão cedo".
Problemas de Segurança e Concorrência Desleal
Testes realizados pela Stiftung Warentest em 30 de outubro revelaram dados alarmantes. Das 162 amostras de produtos adquiridos na Shein e Temu, 110 não cumpriam os padrões europeus e aproximadamente um quarto apresentava riscos potenciais à segurança.
Entre os problemas identificados estavam:
- Níveis elevados de formaldeído em alguns itens
- Presença de metais pesados como cádmio
- Carregadores USB que superaqueciam perigosamente
A BEUC considera que esta situação configura concorrência desleal, já que empresas locais são obrigadas a seguir rigorosamente as normas de segurança europeias.
Resposta Regulatória e Multas Milionárias
As autoridades europeias não permaneceram passivas diante desta situação. Em maio, a Comissão Europeia notificou a Shein sobre violações à legislação de defesa do consumidor, incluindo:
- Descontos falsos e informações enganosas
- Pressão sobre consumidores para conclusão de compras
- Alegações enganosas sobre sustentabilidade
As penalidades já começaram a surgir. A Shein foi multada em 1 milhão de euros pela Itália por alegações ambientais enganosas e em 40 milhões de euros pela França pelos mesmos motivos, elevando para 191 milhões de euros o total de multas francesas à empresa este ano.
Enquanto isso, a Temu enfrenta investigações por possivelmente violar a Lei de Serviços Digitais da UE por não combater suficientemente a venda de produtos ilegais.
O Fator Tributário e o Futuro do Comércio
Um elemento crucial que favoreceu a expansão dessas plataformas foi a isenção de impostos para pacotes abaixo de 150 euros. Porém, a UE está nas etapas finais de aprovação de regra similar à americana para fechar esta brecha, embora sua implementação possa levar até 2028.
Enquanto isso, o crescimento das plataformas continua impressionante. No primeiro semestre de 2025, a Temu registrou 115 milhões de usuários ativos mensais na UE, enquanto a Shein alcançou 145 milhões, representando aumento de aproximadamente 12% para ambas em relação ao semestre anterior.
Especialistas defendem que apenas multas e regulamentações mais rigorosas podem frear as práticas questionáveis, mas alertam que sem uma reforma aduaneira ambiciosa, as empresas continuarão se beneficiando das brechas existentes até 2028.
