Em um contraste entre reconhecimento e dificuldade, o Instituto Olho d'Água, localizado no Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí, venceu o prestigiado Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), na última segunda-feira (1º). A fundadora, Marian Rodrigues, no entanto, revelou que a conquista aconteceu no mesmo momento em que a instituição decidia fechar as portas temporariamente por falta de recursos financeiros.
Uma vitória em meio à luta pela sobrevivência
"Ganhamos o prêmio no dia em que decidimos fechar as portas e entrar de férias por falta de investimento", afirmou Marian Rodrigues, arqueóloga e fundadora do instituto. A declaração resume o paradoxo vivido pela organização, que há anos trabalha para preservar a cultura local enquanto enfrenta incertezas sobre seu próprio futuro.
O Instituto Olho d'Água foi criado em 2013, a partir da pesquisa de mestrado de Marian. Sua missão é oferecer oficinas de bordado, cerâmica e atividades educacionais para os moradores do entorno do parque, preservando os saberes tradicionais da região e gerando renda para as famílias, com destaque para o protagonismo das mulheres bordadeiras.
Impacto na comunidade e no patrimônio
Mais de 200 pessoas, entre adultos e crianças, são beneficiadas diretamente pelas ações do instituto. "Serve para fazer esse registro e memória das pessoas que vivem dentro do parque", explicou a fundadora. Além das oficinas, a organização mantém um Centro de Memória dos Povos da Serra da Capivara e desenvolve atividades de educação ambiental, patrimonial e arqueológica.
O Iphan destacou que o projeto se sobressai pela "transmissão intergeracional dos saberes locais, conectando memória, identidade e sustentabilidade" no território. As peças de bordado produzidas pelas artesãs não apenas carregam histórias, mas também se tornam uma fonte de sustento, com parte da venda revertendo para a manutenção da instituição.
O prêmio como um sopro de esperança
Esta foi a primeira vitória do Instituto Olho d'Água na premiação, após ter concorrido outras quatro vezes. O valor de R$ 35 mil associado ao prêmio foi descrito por Marian como uma ajuda crucial, "parece que Deus mandou", em um momento de extrema necessidade. A instituição se mantém com a venda dos bordados, editais governamentais, doações e investimento parlamentar, mas a verba é constantemente insuficiente.
A fundadora espera que o reconhecimento nacional atraia a atenção dos gestores públicos. "Quem sabe nossos governantes percebam que estamos contribuindo para o Piauí, construindo políticas públicas e culturais", destacou. Para ela, é fundamental que a comunidade contemporânea da Serra da Capivara seja vista e valorizada como parte integrante daquele patrimônio mundialmente conhecido.
O Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade é concedido desde 1987 e, em 2025, teve como tema "Patrimônio Cultural, Territórios e Sustentabilidade". Das 18 ações premiadas em todo o Brasil, o Instituto Olho d'Água foi o único representante do estado do Piauí.