No coração do bairro do Cristo, na zona oeste de João Pessoa, uma semente plantada em 2011 germinou e se transformou em um poderoso agente de mudança. O Grupo Kairós, criado pelo professor Flavinho Ramos, desafia convenções e prova, há mais de uma década, que a arte é um caminho viável e potente para a transformação social de crianças, adolescentes e jovens.
Uma iniciativa nascida da necessidade de inclusão
A motivação para criar o grupo veio de uma percepção aguçada de seu fundador. Flavinho Ramos observou que os grupos de teatro tradicionais tendiam a "supervalorizar" quem já possuía habilidades cênicas natas. Enquanto isso, os jovens que mais precisavam de estímulo e oportunidade para desenvolver sua expressão ficavam à margem, sem condições de participar.
"O Kairós surge dessa necessidade de trazer voz e dar oportunidade a todo mundo", explica o professor. "A quem é extrovertido, a quem sabe falar e àqueles que precisavam só de um empurrãozinho. Não divido por faixa etária, tem meninos de 10 anos e outros de 20, autistas, com TDAH... Todo mundo".
Arte que revela potenciais e constrói futuros
No espaço democrático do Kairós, a arte vai muito além da definição convencional. Para participantes como Maria Sofia, de 12 anos, a experiência foi reveladora. "Eu pensava que arte era só pintar um quadro e pronto. Mas quando cheguei aqui aprendi que arte não é só isso, é cultura e tudo isso que a gente faz aqui", compartilha a jovem.
O grupo adota metodologias que vão além dos ensaios teatrais. Regras como o acesso limitado ao celular durante as atividades e a obrigatoriedade do "Livro de Cabeceira" – que exige a leitura de uma obra por mês para debates – são pilares educacionais. Essas práticas têm gerado frutos concretos: muitos participantes cresceram no grupo e hoje são universitários.
Nathalia Silva, agora estudante de Pedagogia na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), atribui sua conquista ao grupo. "Foi muito difícil, principalmente vindo do lugar que a gente vem, onde as pessoas não acreditam na gente, onde existe sim preconceito com pessoas que moram em favelas e comunidades", relata.
Reconhecimento que transcende as fronteiras do bairro
O trabalho persistente e impactante do Grupo Kairós começou a chamar a atenção além dos limites do bairro do Cristo. A iniciativa conquistou a admiração de personalidades de grande relevância no cenário cultural nacional, como o renomado diretor de novelas Jayme Monjardim.
Monjardim deixou uma mensagem de apoio e reconhecimento: "É incrível o trabalho, a dedicação que ele tem. Então parabéns, que esse ano que entra agora seja muito mais incrível e que vocês possam fazer coisas muito maravilhosas. Contem comigo".
As mães dos participantes são testemunhas diárias da metamorfose. Elas relatam profunda gratidão ao ver a vida de seus filhos se transformar, ganhando autoconfiança, disciplina e novas perspectivas por meio da expressão artística. O Grupo Kairós segue, assim, não apenas encenando histórias, mas reescrevendo trajetórias de vida na periferia de João Pessoa, mostrando que o palco da transformação social está aberto para todos.