Ex-ministro Raul Jungmann: 'Não se encara bandido com fuzil com teorias'
Jungmann defende uso da força e reforma no sistema prisional

O ex-ministro da Segurança Pública Raul Jungmann defendeu que há situações em que o uso da força pela polícia é inevitável, especialmente quando criminosos estão armados com fuzis. Em entrevista exclusiva, o ex-ministro analisou os recentes acontecimentos no Rio de Janeiro e a proposta do governo de combate às facções criminosas.

Lei Antifacção e o rompimento com "conceitos equivocados"

Três dias após a operação policial mais letal da história do Rio de Janeiro, o governo federal encaminhou ao Congresso Nacional a chamada Lei Antifacção. Para Jungmann, a proposta "vem em boa hora" e representa uma mudança importante no enfrentamento ao crime organizado.

"A lei rompe com alguns conceitos equivocados da esquerda", afirmou o ex-ministro. "Enquanto democratas abraçavam direitos humanos, a direita abraçava a segurança pública à sua maneira. E a população aplaude o que aconteceu no Rio porque não tem outro modelo para comparar."

Jungmann explicou que o projeto prevê medidas como:

  • Fim da progressão de pena para líderes de facções
  • Endurecimento de conceitos legais
  • Possibilidade de infiltração policial nas organizações criminosas
  • Proteção especial para juízes

Direitos humanos versus direito à segurança

O ex-ministro fez questão de equilibrar sua defesa do uso da força com a necessidade de preservar os direitos humanos. "Se você encarar um bandido armado com fuzil atirando, você não vai resolver esse problema com teorias", argumentou.

Porém, Jungmann foi enfático ao lembrar que o direito da população à paz e à segurança também são direitos humanos. "O direito em não ser torturada, de não ser deslocada da sua casa pelo Comando Vermelho, o direito de ter paz - isso também são direitos humanos e tem que ser levado em conta."

Sobre a proposta da oposição de enquadrar as facções na Lei Antiterrorismo, o ex-ministro se mostrou contrário: "O crime organizado busca lucros ilícitos, já o terrorismo se dá no campo da política. São coisas diferentes que exigem abordagens distintas."

Sistema prisional: a máquina de fortalecer o crime

Jungmann foi crítico ao descrever o atual sistema penitenciário brasileiro como uma "máquina de crescer, expandir e fortalecer o crime organizado". Segundo ele, cerca de 80% a 90% das penitenciárias estão controladas por facções criminosas.

"Quando os apenados voltam para as ruas, há uma mudança: eles não são mais bandidos isolados, e sim bandidos a serviço das facções criminosas", explicou. "Todos os presos, para sobreviver dentro do sistema, precisam se associar a uma facção. Se não, correm risco de morte."

O ex-ministro defendeu uma reforma profunda no sistema, incluindo:

  • Oferecimento de trabalho e formação profissional
  • Educação para os presos
  • Revisão da política de drogas
  • Foco na recuperação em vez de apenas na punição

Coordenação nacional e resistência política

Jungmann também comentou sobre o Sistema Único de Segurança Pública (Susp), projeto sancionado durante sua gestão há oito anos mas que ainda não foi implementado. Segundo ele, o governo Bolsonaro era contrário à medida e a "engavetou", enquanto o governo Lula agora tenta constitucionalizá-la.

"É uma medida urgente", defendeu. "Enquanto temos 27 estados cuidando da segurança pública, o governo federal não cuida. Precisamos de uma centralização."

O ex-ministro atribui a resistência dos governadores a questões eleitorais: "Eles não querem perder poder e acreditam que a eleição de 2026 será decidida fundamentalmente sobre a segurança pública. É assunto eleitoral."

Jungmann lembrou que a criação do Ministério da Segurança Pública ocorreu em 2018, um dia após a intervenção federal no Rio de Janeiro, durante o governo de Michel Temer. Na época, ele assumiu a nova pasta após deixar o Ministério da Defesa.

Para o ex-ministro, o tema da segurança foi "contaminado por questões eleitorais", mas continua sendo uma agenda urgente para o país. Enquanto o debate não avança, o crime organizado continua se nacionalizando e se transnacionalizando, exigindo respostas cada vez mais complexas e coordenadas.