Uma tentativa de ressuscitar o falido Banco Master, alvo de intervenção e liquidação pelo Banco Central (BC) em dezembro de 2025, ganhou um capítulo judicial surpreendente. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Antônio Dias Toffoli, determinou para 30 de dezembro uma acareação por vídeo entre as partes envolvidas no escândalo de fraudes de crédito estimadas em R$ 12,2 bilhões.
Do veto à intervenção: a queda do Master
A crise do Banco Master, presidido por Daniel Vorcaro, veio à tona de forma definitiva quando o Banco Central vetou, em 3 de setembro de 2025, a compra de 49% das ações ordinárias da instituição pelo Banco Regional de Brasília (BRB). A operação, proposta em maio, foi barrada após a descoberta das gigantescas fraudes. Pouco depois, em 18 de dezembro, o BC decretou a intervenção e o início da liquidação do Master.
O banco se destacava no mercado por uma captação agressiva de recursos, oferecendo rendimentos de até 140% do CDI e pagando comissões generosas a grandes distribuidoras como XP, Nu bank e BTG Pactual. Essa estratégia, porém, escondia um modelo insustentável. Com a liquidação, o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) pode ter que honrar passivos que superam a marca de R$ 61 bilhões.
As manobras judiciais e a acareação de Toffoli
O caso ganhou contornos inusitados com decisões individuais em tribunais superiores. No Tribunal de Contas da União (TCU), o ministro Jhonatan Pereira de Jesus, sozinho e com a corte em recesso, pediu explicações ao BC e ameaçou suspender a liquidação, causando perplexidade, já que não há recursos públicos diretos envolvidos.
Mais surpreendente foi a decisão do ministro do STF, Dias Toffoli, de marcar a acareação para 30 de dezembro. A audiência, parte do inquérito da Operação Compliance da Polícia Federal, reuniria o presidente do Master, Daniel Vorcaro, o ex-presidente do BRB, Paulo Henrique Costa, e o diretor de Fiscalização do BC, Aílton de Aquino Santos. A estranheza no mercado se deve ao fato de que o veto à operação foi assinado por outro diretor do BC, Renato Dias Brito Gomes, exonerado antecipadamente pelo presidente Lula.
Laços políticos e questões éticas
A radiografia do Banco Master revela uma instituição com forte influência no Centrão, especialmente junto a PP e União Brasil. Fundos de pensão de estados governados por aliados, como Rio de Janeiro (com quase R$ 2 bilhões aplicados) e Amapá (R$ 400 milhões), estão entre os maiores credores e correm risco de calote por ultrapassarem o teto de garantia do FGC.
As conexões se estendem ao próprio STF. Revelou-se que o escritório da advogada Viviani Barci de Moraes, esposa do ministro Alexandre de Moraes, celebrou um contrato milionário com o Banco Master em janeiro de 2024, que renderia R$ 3,6 milhões mensais até 2027. Com a intervenção, o contrato foi interrompido, mas já teria rendido cerca de R$ 79 milhões em 22 meses.
A situação de Toffoli também foi alvo de questionamentos. O ministro viajou para o Peru, em novembro, no avião particular do empresário Luiz Oswaldo Pastore, para assistir à final da Libertadores. No mesmo voo, estava o advogado Augusto Arruda Botelho, que defende o diretor de compliance do Master, Luiz Antônio Bull. Toffoli afirmou que no voo só se tratou de amenidades futebolísticas.
Consequências e um cenário de incertezas
Especialistas do mercado financeiro consideram inviável qualquer reviravolta que permita ao Master voltar a operar. Mesmo com nova marca, a instituição enfrentaria desconfiança total do mercado, incapaz de captar recursos ou encontrar distribuidores para seus papéis.
Para além do prejuízo financeiro, o caso produz arranhões na credibilidade de instituições como o STF e o TCU. A promiscuidade entre altos magistrados e o mundo político-financeiro, com participação em eventos bancados pelo banco e atuação de familiares na defesa de interesses privados, coloca em xeque a percepção de imparcialidade.
A acareação determinada por Toffoli, ainda que vista como esdrúxula por muitos, é agora o próximo passo para tentar clarear as investigações sobre as fraudes. Enquanto isso, o Banco Master segue seu processo de liquidação, deixando um rastro de prejuízos bilionários e questionamentos éticos que devem ecoar por muito tempo no sistema financeiro e no Judiciário brasileiros.