A velocidade do Pix revolucionou as transações no Brasil, mas também acelerou a criatividade dos criminosos. Golpes cada vez mais rápidos e sofisticados se aproveitam da agilidade do sistema para aplicar fraudes difíceis de rastrear. Em resposta, o Banco Central implementou um pacote de medidas de segurança, com destaque para o Mecanismo Especial de Devolução (MED), uma ferramenta que funciona como um "botão de emergência" dentro do aplicativo bancário.
O "botão de emergência" do Pix e o desafio do letramento digital
O MED permite que o usuário conteste uma transação de forma imediata ao perceber que foi vítima de um golpe, sem precisar acionar a Justiça como primeiro passo. Lucas Kannoa, professor de Direito da Faculdade Estácio, explica que o mecanismo simula um atendimento que antes só era possível nas agências físicas, reduzindo a judicialização e facilitando a proteção do consumidor.
No entanto, Kannoa alerta que a tecnologia esbarra em um problema estrutural: o déficit de letramento digital da população. "O consumidor brasileiro se adaptou muito rápido ao Pix, mas não necessariamente tem fluência digital para compreender os riscos", afirma. Ele destaca que redes sociais e aplicativos de mensagem amplificam a exposição de públicos vulneráveis a esquemas elaborados.
"O Brasil foi surpreendido pelo avanço das redes sociais. Pessoas que nunca tiveram letramento formal hoje se comunicam intensamente nesses ambientes — e recebem o Pix com a mesma velocidade", diz o professor. A conclusão é direta e preocupante: "A vulnerabilidade se apresenta porque o uso vem antes da compreensão." Esse cenário afeta especialmente idosos e pessoas com menor acesso à educação digital, um desafio que, segundo ele, demanda políticas públicas de inclusão.
Responsabilidade dos bancos e a importância crucial da denúncia
Do ponto de vista jurídico, Kannoa lembra que as instituições financeiras, que lucram com as plataformas, têm o dever de garantir a segurança do usuário. A lógica é que o consumidor não pode ser penalizado por não dominar a complexidade técnica dos sistemas. A situação se complica ainda mais porque muitas operações criminosas são transnacionais, com núcleos de quadrilhas atuando fora do Brasil, o que dificulta a punição direta.
Um dos alertas mais enfáticos do especialista é sobre a "cifra oculta" dos crimes não reportados. "Muita gente não denuncia porque acha que não vai dar em nada. Mas quando não denuncia, esconde dados importantes da polícia", afirma. Sem esses registros, os órgãos de segurança perdem a capacidade de mapear padrões e combater as fraudes de forma eficiente.
Passo a passo: o que fazer se você for vítima de um golpe no Pix
Agir com rapidez é fundamental para aumentar as chances de recuperar o valor. Lucas Kannoa recomenda a seguinte sequência de ações:
- Acione o MED imediatamente pelo aplicativo do seu banco.
- Registre um boletim de ocorrência, de preferência em delegacias especializadas em crimes cibernéticos.
- Procure o Procon, que oferece suporte gratuito e não exige a presença de um advogado. "É o espaço mais seguro para o consumidor", destaca Kannoa.
- Recorra à Justiça, se necessário, por meio dos Juizados Especiais ou da Defensoria Pública.
Apesar das novas regras e ferramentas, o professor reforça que a principal defesa continua sendo o ceticismo saudável. Ofertas com preços absurdamente baixos, promoções milagrosas e sites com URLs suspeitas são sinais clássicos de fraude.
Em resumo, a tecnologia oferece mecanismos de proteção, mas não substitui a atenção do usuário. Kannoa resume a situação com uma metáfora contundente: usar o Pix e as redes sociais sem letramento digital é como "dirigir um carro de alta velocidade sem saber ler as placas de trânsito". A viagem pode ser rápida, mas o risco de um acidente grave é enorme.