A área técnica do Tribunal de Contas da União (TCU) fez uma recomendação de peso à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). O órgão sugeriu que a agência reguladora avalie a possibilidade de intervir na concessão da Enel, empresa responsável pela distribuição de energia em São Paulo. A medida é uma resposta direta à recorrência de falhas no serviço prestado pela concessionária, que ficaram ainda mais evidentes após os eventos climáticos extremos dos últimos anos.
Falhas e multas milionárias pressionam concessionária
O cenário para a Enel São Paulo é de forte pressão regulatória e financeira. Multas em aberto contra a empresa já superam a marca de R$ 260 milhões somente no estado. No total, a Aneel já aplicou mais de R$ 300 milhões em penalidades à distribuidora. Os problemas se acumulam, especialmente após tempestades intensas que atingiram a capital e o interior.
Em outubro de 2023, fortes chuvas deixaram diversos bairros da cidade de São Paulo sem energia elétrica por vários dias, expondo a lentidão e a incapacidade de resposta rápida da Enel. Situação semelhante se repetiu em outubro de 2024, com novos temporais causando longos apagões e revivendo a crise de confiança dos consumidores.
Processo pode levar ao fim da concessão antes de 2028
O contrato de concessão da Enel São Paulo está vigente até 2028, mas a empresa já solicitou uma renovação antecipada. No entanto, um processo aberto pela Aneel pode mudar completamente esse cenário. O procedimento, que analisa as falhas graves da empresa, pode resultar na cassação da concessão, um movimento conhecido como "caducidade".
Em novembro, o diretor da Aneel, Gentil Nogueira de Sá Júnior, pediu mais tempo para analisar o caso. A relatora do processo, a diretora Agnes Maria de Aragão da Costa, votou para acompanhar o relatório da área técnica da própria Aneel, que fundamenta a ação. A palavra final sobre um eventual término forçado do contrato caberá ao Ministério de Minas e Energia.
Melhoria temporária não convence técnicos da Aneel
Apesar do quadro grave, a Enel apresentou alguns avanços. A área técnica da Aneel reconheceu que houve uma diminuição no tempo médio de atendimento a emergências após a implementação de um plano de recuperação. O número de interrupções de energia que duraram mais de 24 horas também caiu, e a empresa mobilizou mais equipes para situações de contingência.
Contudo, os técnicos são céticos. Eles argumentam que as melhorias podem ser de "caráter provisório", já que não houve um período de chuvas significativo após as ações corretivas. Por isso, a recomendação é que a Enel continue sob supervisão regulatória rigorosa até, pelo menos, março de 2026. O objetivo é verificar se as melhorias se sustentam durante uma estação chuvosa, após a conclusão de todas as obras e ações estruturais prometidas.
Disputa regulatória e posicionamento de entidades
A análise sobre o fim da concessão acontece paralelamente ao pedido de renovação feito pela Enel. O diretor-geral da Aneel, Sandoval Feitosa, foi claro ao afirmar que o processo sancionador deve ser julgado antes de qualquer discussão sobre renovação. "Não vejo possibilidade de avançar na renovação antes de deliberar sobre o processo sancionador", declarou.
A pressão contra a renovação automática também vem de outras frentes. O Ministério Público Federal em São Paulo pediu a suspensão imediata do processo de renovação. A Prefeitura de São Paulo se manifestou na mesma direção, cobrando que não haja renovação sem uma revisão profunda dos critérios usados para avaliar a qualidade do serviço prestado à população.
O futuro da Enel em São Paulo, portanto, depende de sua capacidade de provar, na prática e sob condições climáticas adversas, que conseguiu resolver de forma definitiva suas falhas crônicas. Enquanto isso, a ameaça de intervenção e de perda da concessão paira sobre a empresa, que tem até 2028, ou menos, para reverter esse quadro.