O poder oculto dos colchetes nas negociações climáticas
Enquanto os olhos do mundo se voltam para a COP30 em Belém, um simples símbolo ortográfico emerge como peça fundamental nas discussões que moldarão o futuro do planeta. Os colchetes [ ], frequentemente ignorados no dia a dia, assumem papel crucial na formulação do texto final da conferência, que será apresentado no próximo dia 21 de novembro.
Por que os colchetes importam tanto?
Estes sinais gráficos abraçam os termos mais controversos das negociações, mas que são essenciais para definir as políticas climáticas globais. A forma como o texto é estruturado pode determinar, por exemplo, se uma medida específica será mandatória ou apenas recomendada.
"Quando se entra no processo de formulação de uma decisão, nem todo mundo vai concordar com a sentença toda, então precisa destacar o que não é consenso, para ver se o texto fica ou sai", explica Natalie Unterstell, presidente do Instituto Tanaloa. "Uma coisa é o conteúdo que está sendo discutido, outra é a forma de comunicá-lo".
Histórico de debates semânticos
As edições anteriores da COP foram marcadas por intensas discussões em torno dos textos finais. Um dos exemplos mais emblemáticos ocorreu em Dubai, em 2023, quando o mundo decidiu, pela primeira vez, que deveria "se afastar" das fontes de petróleo.
Antes de chegar a essa expressão, os negociadores cogitaram termos como "transição gradual" e "eliminação gradual". Os países produtores e dependentes de petróleo pressionaram e conseguiram suavizar o texto final, resultando em uma discussão quase semântica sobre uma das decisões mais importantes já tomadas em COPs.
Muitas nações interpretam que esse compromisso funciona apenas como um indicador de direção, não como uma medida obrigatória. Esta nuance, muitas vezes determinada pelos colchetes, pode significar a diferença entre ação concreta ou mera intenção.
A pressão da sociedade civil
Quem participa da COP na condição de sociedade civil também reconhece o poder dos colchetes e pressiona os governos para incluir determinados termos entre esses símbolos. Esta é a maneira de garantir que agendas específicas sejam contempladas pela ONU nos documentos finais.
"Um monte de gente vem com uma agenda única e faz o que for necessário para ver sua causa refletida no texto final, mas é preciso ter cuidado. Não é porque determinada palavra entrou ou deixou de entrar que a decisão é boa ou ruim", alerta Natalie Unterstell.
Os países membros que integram as plenárias dedicam horas – às vezes dias – definindo os termos exatos que serão colocados entre colchetes. Este processo meticuloso demonstra como cada palavra pode carregar consequências significativas para o futuro das ações climáticas globais.
Enquanto isso, na COP30 em Belém, os colchetes continuam seu trabalho silencioso mas essencial, moldando o vocabulário que guiará as políticas ambientais dos próximos anos e definindo os rumos da luta contra as mudanças climáticas.