Creatina contra depressão: estudo brasileiro analisa eficácia do suplemento
Creatina na depressão: estudo brasileiro revela efeitos

Um dos suplementos mais populares entre atletas e frequentadores de academias está sendo investigado por uma nova função: auxiliar no tratamento da depressão. Pesquisadores brasileiros realizaram uma das revisões mais abrangentes já feitas sobre o tema, analisando a relação entre a creatina e a saúde mental.

Do músculo ao cérebro: como a creatina pode ajudar

A creatina é uma substância naturalmente produzida pelo corpo humano nos rins, fígado e pâncreas, além de ser obtida através do consumo de carnes e peixes. No mundo esportivo, ela é conhecida por fornecer energia aos músculos, mas pesquisadores começaram a investigar se esse mesmo efeito poderia beneficiar o cérebro.

O raciocínio biológico por trás dessa hipótese é sólido: o cérebro é um dos órgãos que mais consomem energia no organismo, e a creatina participa diretamente da produção e transporte desse combustível nas células. Estudos anteriores já haviam indicado que pessoas com depressão tendem a apresentar níveis mais baixos de fosfocreatina no cérebro.

Estudo indiano mostra resultados promissores

Uma pesquisa publicada em fevereiro de 2025 na revista European Neuropsychopharmacology chamou atenção pelos resultados. O estudo, conduzido na Índia, envolveu 60 pessoas com depressão de leve a grave que estavam há pelo menos oito semanas sem usar antidepressivos.

Metade dos participantes recebeu 5 gramas diárias de creatina monohidratada em pó, enquanto a outra metade tomou a mesma quantidade de amido como placebo. Todos também participaram de sessões quinzenais de terapia cognitivo-comportamental.

Os resultados mostraram que ambos os grupos melhoraram, mas quem recebeu creatina apresentou uma redução mais significativa dos sintomas. A pontuação média no grupo da creatina caiu para 5,8 (indicando depressão leve), enquanto o grupo placebo ficou em 11,9 (depressão moderada).

Revisão brasileira traz novas perspectivas

A nova análise, publicada no British Journal of Nutrition por pesquisadores brasileiros, reuniu 11 estudos clínicos que testaram o suplemento em pessoas com quadros depressivos. A revisão incluiu tanto pesquisas já publicadas quanto outras que ainda não haviam sido divulgadas publicamente.

Os estudos selecionados para a análise precisavam comparar grupos que receberam creatina por via oral com outros que tomaram placebo, sempre medindo os sintomas de depressão através de questionários validados cientificamente.

Os resultados mostraram que a creatina superou o placebo na maioria dos casos, resultando numa redução média de 2,2 pontos na Escala de Hamilton, utilizada para medir a gravidade da depressão. No entanto, segundo os próprios autores, uma diferença clinicamente relevante começaria a partir de 3 pontos.

"O resultado é estatisticamente significativo, mas ainda não parece clinicamente expressivo", explica o nutricionista Igor Eckert, um dos autores da revisão. "Chegamos a testar se excluir o estudo com resultado mais negativo mudaria o quadro, mas não mudou".

Limitações e perspectivas futuras

A análise revelou uma grande variação entre os estudos: alguns mostraram benefícios consideráveis, enquanto outros praticamente não detectaram efeitos. Além disso, muitos ensaios tinham limitações importantes, como:

  • Amostras pequenas de participantes
  • Duração curta (geralmente de quatro a dez semanas)
  • Alto risco de viés, como a possibilidade de os participantes descobrirem se estavam tomando creatina ou placebo

Os resultados pareceram mais promissores quando a creatina foi usada como complemento ao tratamento convencional, junto de antidepressivos ou sessões de terapia. Quando testada isoladamente, os efeitos foram bem menos consistentes.

"Ainda há mais dúvidas do que certezas", resume Eckert. "Não dá para afirmar que 'funciona', porque a maioria dos estudos tem vieses e fragilidades metodológicas".

Apesar dos resultados modestos, a pesquisa abre caminho para investigações mais aprofundadas sobre o papel da creatina na saúde mental e seu potencial como coadjuvante no tratamento da depressão.