Homens morrem 50% mais por doenças evitáveis, revela estudo
Homens morrem mais por evitar cuidados médicos

Homens brasileiros enfrentam crise silenciosa na saúde

Uma combinação perigosa de fatores culturais e educacionais está levando os homens a negligenciarem sua saúde com muito mais frequência do que as mulheres. O resultado são diagnósticos tardios e mortes precoces que poderiam ser evitadas, conforme revelam especialistas ouvidos em reportagem do CETV.

O peso da cultura do "homem forte"

A imagem masculina construída ao longo de séculos como figura forte, viril e provedora da família cria uma percepção cultural de que eles não podem demonstrar fraqueza. No século 21, esse sentimento se reflete diretamente no descaso com a saúde.

Maria Luísa conhece bem as consequências dessa realidade. Viúva há cinco anos após um casamento de mais de três décadas, ela viu o marido, Aladim, ir ao médico apenas três vezes em toda a vida conjugal. Ele morreu aos 64 anos vítima de um infarto seguido de um AVC.

"Um dia a gente enganou ele, dizendo que ia levar ele para o shopping. Entrou em desespero dentro do carro. 'Para, para esse carro, se vocês não pararem, eu vou pular, porque vocês não estão me levando para o shopping, vocês estão me levando para o médico'", recorda a viúva com emoção.

Para Maria Luísa, as decisões do marido deixaram marcas profundas. "Eu não tinha noção que eu ia perder meu marido tão rápido. Me preparei para receber outro diagnóstico, não diagnóstico de morte", desabafa.

Números alarmantes revelam gravidade do problema

Essa aversão ao consultório tem impacto direto nas estatísticas de saúde pública. Os dados são preocupantes:

  • Homens morrem 50% mais do que mulheres por problemas respiratórios como pneumonia e asma grave
  • Óbitos por problemas vasculares (infarto, trombose e AVC) são 40% mais frequentes entre o público masculino
  • Um dos motivos centrais é que os homens raramente buscam o atendimento primário em postos de saúde

Rui de Gouveia, gerente da Célula de Vigilância Epidemiológica, explica que o Ministério da Saúde enxerga o problema como "socioeducativo", demandando um trabalho intensivo de conscientização.

"Aqui no Nordeste a gente tem ainda muito essa cultura, a cultura do sertanejo, a cultura daquele homem forte. E, às vezes, ele não se dá o direito de ficar um pouco mais frágil", comenta Rui. "É importante a gente entender que nosso corpo, nós seres humanos, precisamos de cuidado."

Histórias de transformação inspiram mudanças

O engenheiro civil Lucas Moraes representa um caso de sucesso na quebra desse paradigma. Ele admitiu que mergulhou de cabeça no trabalho, parou de se cuidar, engordou e abandonou os exercícios. Foram necessários alertas da família para que percebesse a transformação negativa.

"Teve um empurrão da família também, de me chamar a atenção, puxar a orelha mesmo, para lembrar quem eu era", conta Lucas. "Quando você está naquela rotina de trabalho... você não se percebe mudando e prejudicando a própria vida. Realmente precisou de alguém externo."

Depois de um choque com os resultados de exames, Lucas mudou completamente sua rotina. Agora, faz exames a cada seis meses, tem acompanhamento nutricional e a atividade física é parte fundamental do seu dia.

Conscientização como caminho para a mudança

Especialistas ouvidos pelo CETV destacam que a busca preventiva continua sendo a melhor forma de se cuidar. Em Fortaleza, conforme a Secretaria Municipal de Saúde, foram realizados cerca de 3,6 milhões de atendimentos na atenção primária a homens entre janeiro e agosto deste ano.

Rui de Gouveia ressalta que a ideia do Novembro Azul, inicialmente focada no câncer de próstata, evoluiu significativamente.

"Gradativamente, ao longo dos anos, a Secretaria Municipal de Saúde de Fortaleza começou a mudar essa visão e realmente tentar trazer o homem para o autocuidado, fazer com que o homem perceba a necessidade de se cuidar, o homem entender que cuidar da sua saúde também envolve ajudar a cuidar da saúde dos outros"

A mensagem final é clara: cuidar da saúde não é sinal de fraqueza, mas de inteligência e responsabilidade consigo mesmo e com aqueles que amamos.