Bebê nasce de embrião congelado há 30 anos: recorde na fertilização in vitro
Bebê nasce de embrião congelado há 30 anos nos EUA

Um fato extraordinário na medicina reprodutiva chamou a atenção do mundo recentemente: o nascimento de um bebê nos Estados Unidos a partir de um embrião que permaneceu congelado por incríveis 30 anos. O material biológico, preservado desde 1994, foi utilizado em uma fertilização in vitro (FIV) e deu origem a uma criança saudável, batendo o recorde de longevidade para um embrião congelado que resulta em um nascimento bem-sucedido.

A evolução das técnicas de reprodução assistida

A história da FIV é marcada por avanços constantes. A primeira bebê de proveta, Louise Brown, nasceu em 1978 após cerca de 200 tentativas frustradas. Naquela época, todos os embriões gerados eram transferidos imediatamente para o útero, pois não existia tecnologia eficaz para congelá-los e preservá-los para uso futuro.

Com o tempo, os desafios, como as gestações múltiplas (gêmeos, trigêmeos), impulsionaram o desenvolvimento de protocolos mais seguros de estimulação ovariana, meios de cultivo aprimorados e, principalmente, técnicas de criopreservación. Hoje, congelar gametas (óvulos e espermatozoides) ou embriões é uma prática corriqueira nos centros de reprodução assistida.

O sucesso desses tratamentos ainda está intimamente ligado à idade da mulher, um fator crucial que afeta a qualidade dos óvulos. Por isso, a estratégia atual busca, sempre que possível, obter vários embriões em um único ciclo de estimulação. Normalmente, transfere-se um embrião por vez, no estágio de blastocisto, e os excedentes de boa qualidade são criopreservados para tentativas futuras, reduzindo o tempo até a gravidez desejada.

Como funciona a criopreservação de embriões

A técnica não serve apenas para planejar futuras gestações. Ela é indicada em casos de risco de síndrome de hiperestimulação ovariana, quando se deseja realizar testagem genética dos embriões antes da transferência, ou para preservar a fertilidade de pacientes que enfrentarão tratamentos oncológicos.

O grande desafio do congelamento é proteger as células de dois fenômenos destrutivos: a formação de cristais de gelo no interior celular e o aumento da concentração de sais. O processo, de forma simplificada, substitui a água dentro da célula por uma substância crioprotetora.

No passado, esse procedimento era lento e complexo. A grande revolução veio com a vitrificação, método ultra-rápido realizado em minutos por embriologistas especializados. Os embriões são armazenados em hastes identificadas e mantidos em tanques com nitrogênio líquido a -196°C. Nesse ambiente estável, eles ficam literalmente parados no tempo.

Por que embriões antigos ainda podem ser viáveis?

Não existe um prazo máximo determinado para a criopreservação. Como o ambiente de nitrogênio líquido é extremamente estável, o embrião não envelhece. Sua viabilidade após o descongelamento depende mais das condições em que foi congelado inicialmente e da qualidade do embrião naquele momento do que propriamente do tempo de armazenamento.

O caso do bebê nascido após 30 anos é um exemplo disso. Embriões congelados com técnicas mais antigas podem ser descongelados utilizando a tecnologia atual de vitrificação, que foi decisiva para o sucesso desse caso histórico.

Essa possibilidade abre um leque de novas configurações familiares: irmãos nascidos com anos de diferença a partir do mesmo ciclo de FIV, ou a chamada "adoção intraútero", quando embriões doados são implantados em outras famílias. As técnicas de reprodução assistida, que já permitiram o nascimento de cerca de 15 milhões de pessoas no mundo, continuam reescrevendo as possibilidades da maternidade e paternidade.

* A especialista Maria do Carmo Borges de Souza, autora do texto original, é médica especialista em reprodução humana, diretora da FERTIPRAXIS – Centro de Reprodução Humana e professora da UFRJ.