O Ministério Público Federal (MPF) iniciou uma apuração para verificar se a decisão da Prefeitura do Rio de Janeiro de incluir um palco gospel na programação oficial do Réveillon de 2025 configura um ato de intolerância religiosa. A investigação foi aberta no dia 30 de dezembro de 2025, após uma série de críticas e polêmicas públicas.
A origem da polêmica
A controvérsia surgiu quando a administração municipal, comandada pelo prefeito Eduardo Paes (PSD), divulgou os detalhes da festa de ano novo. Entre os 13 palcos que serão espalhados pela cidade, um foi reservado exclusivamente para shows do gênero gospel, localizado na Praia do Leme, na Zona Sul. Artistas como Midian Lima, Samuel Messias, Thalles Roberto e o grupo Marcados Pagode Gospel estão confirmados.
Esta não é a primeira vez que a iniciativa acontece. Em 2024, durante a mesma gestão, um palco semelhante foi montado, reflexo da boa relação de Paes com líderes evangélicos locais. No entanto, a repetição do ato em 2025 acendeu o debate sobre representatividade e igualdade no uso do espaço público.
Críticas e defesa acirradas
A principal crítica partiu do babalawô Ivanir dos Santos. Em declarações à coluna do jornalista Ancelmo Gois, no jornal O Globo, Santos argumentou que as religiões de matriz africana, que historicamente contribuem para o simbolismo do Réveillon carioca com oferendas a Iemanjá, não recebem o mesmo tratamento e espaço dedicado. “A diversidade não pode ser apenas um discurso”, afirmou, defendendo que é preciso “práticas concretas de reconhecimento, representação e igualdade no uso do espaço público”.
A réplica do prefeito foi imediata e contundente. Inicialmente, Paes classificou o posicionamento como “preconceito dessa gente”, defendendo que o Réveillon de Copacabana é para todos e que a música gospel também merece seu lugar. A declaração, porém, gerou mais descontentamento.
Pedido de desculpas e justificativa
Diante da repercussão negativa do termo utilizado, Eduardo Paes recuou e pediu desculpas publicamente. Através de sua conta no Twitter (X), no dia 29 de dezembro, o prefeito se desculpou “a quem é contra o palco gospel” e reforçou seu compromisso com a liberdade religiosa.
“Minha defesa às religiões de matriz africana e a liberdade religiosa de forma geral é pública e notória! Me desculpo adiantado com os ritmos que não foram incluídos nesse réveillon! Prometo mais atenção”, escreveu. Na mesma publicação, ele listou a variedade de gêneros musicais contratados para os outros palcos, tentando demonstrar a pluralidade da programação.
Investigação do MPF e próximos passos
Foi nesse contexto de acusações públicas e defesas acaloradas que o Ministério Público Federal decidiu intervir. A apuração tem como objetivo examinar juridicamente se a alocação de um espaço exclusivo para um segmento religioso específico, em um evento público e financiado com recursos municipais, caracteriza uma prática de intolerância religiosa ou favorecimento indevido.
A investigação do MPF agora vai analisar os argumentos de ambas as partes e o marco legal sobre liberdade religiosa e uso do espaço público. O desfecho do caso poderá estabelecer um precedente importante para a organização de grandes eventos culturais e religiosos patrocinados pelo poder público em todo o país.