A relação entre o Palácio do Planalto e a cúpula do Congresso Nacional enfrenta um dos seus momentos mais tensos desde o início do governo Lula. Nesta segunda-feira (24), declarações públicas de lideranças do Senado e da Câmara dos Deputados expuseram atritos significativos com o governo e entre os próprios parlamentares, acendendo um alerta sobre a fragilidade da base governista.
Indicação de Messias ao STF emperra no Senado
No Senado Federal, o líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA), admitiu publicamente que a votação da indicação de Jorge Messias ao Supremo Tribunal Federal (STF) dificilmente ocorrerá ainda este ano. Em entrevista à GloboNews, o senador baiano foi categórico ao afirmar que não há condições políticas nem calendário suficiente para votar a nomeação em dezembro.
"Eu acho que nós não teremos tempo hábil para votar ainda no mês que se inicia na segunda-feira que vem", declarou Wagner, referindo-se às apenas quatro semanas úteis até o recesso parlamentar.
O líder governista listou obstáculos concretos como a pauta carregada pela tramitação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e do Orçamento da União. No entanto, admitiu que o fator político pesa tanto quanto o cronograma apertado.
Segundo Wagner, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), ficou "chateado" por não ter sido avisado antecipadamente da escolha de Messias por Lula, o que gerou um clima de "tensão muito grande" na Casa. Diante desse cenário, o senador sugeriu que a sabatina de Messias pode ficar para 2026.
Crise aberta na Câmara dos Deputados
Se no Senado a crise se desenvolve de forma mais silenciosa, na Câmara dos Deputados o conflito veio à tona de maneira explícita. O presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), rompeu politicamente com o líder do PT, deputado Lindbergh Farias (PT-RJ).
Em declaração à Folha de S.Paulo, Motta foi direto: "Não tenho mais interesse em ter nenhum tipo de relação com o deputado Lindbergh Farias." A ruptura ocorreu após uma sequência de desentendimentos entre os dois, especialmente em torno de votações sensíveis nas últimas semanas.
Lindbergh Farias respondeu com uma nota dura, classificando a posição de Motta como "imaturo" e afirmando que o presidente da Câmara age de maneira "errática". O petista defendeu que "política não se faz como clube de amigos" e que suas posições são transparentes e previsíveis.
Entre parlamentares, o estopim para a crise é atribuído a três fatores principais: a derrubada da medida do IOF, a PEC da Blindagem e a escolha, sem consulta ao governo, do deputado Guilherme Derrite como relator de um projeto de autoria do Executivo.
Impacto direto no governo Lula
Os dois movimentos simultâneos - o travamento da indicação ao STF e o confronto direto na Câmara - são vistos no Planalto como sintomas de um desgaste mais profundo na articulação política do governo.
Integrantes da equipe de Lula avaliam que as cúpulas das duas Casas legislativas estão insatisfeitas com a forma como a articulação política tem sido conduzida. Há preocupação com o fato de que o presidente perdeu controle sobre o ritmo e o ambiente das votações.
A coalizão governista, por sua vez, enfrenta dificuldades crescentes para manter o alinhamento interno. O temor no Planalto é que a crise atual possa contaminar temas essenciais e tornar imprevisível a votação da LDO e do Orçamento, peças fundamentais para o funcionamento do Estado no próximo ano.
O cenário preocupa especialmente porque se aproxima o fim do ano legislativo, com várias pautas importantes ainda pendentes de votação. A capacidade de articulação política do governo será testada nas próximas semanas em meio a este ambiente de tensão e desconfiança mútua.