Foto de brasileira vira prova em denúncia de fraude eleitoral na Índia
Brasileira vira prova em fraude eleitoral na Índia

Cabeleireira de BH vira personagem involuntária em crise política na Índia

Uma simples foto profissional tornou-se o centro de um escândalo político internacional que liga Belo Horizonte à Índia. Larissa Nery, cabeleireira de 29 anos, descobriu durante seu almoço de quarta-feira (5/11) que havia se tornado uma espécie de celebridade no país asiático, que ela nunca visitou.

Em poucas horas, seu rosto estampava a capa de diversos sites de notícias indianos, enquanto notificações e marcações nas redes sociais começaram a surgir sem parar em seu celular. "Pensei que fosse alguma brincadeira com IA [inteligência artificial], pessoas me zoando", confessou ela à BBC News Brasil.

Foto vira prova em denúncia de fraude eleitoral

A imagem de Larissa não era uma criação artificial, mas sim uma peça fundamental nas acusações de fraude eleitoral feitas pela oposição indiana. O político Rahul Gandhi, principal líder oposicionista, exibiu a foto da brasileira durante uma entrevista coletiva que teve ampla repercussão no país.

Gandhi apresentou uma compilação de 22 eleitores com nomes e endereços diferentes que supostamente usavam a mesma foto de Larissa Nery em seus registros. "Quem é essa senhora? Quantos anos ela tem? Ela votou 22 vezes em Haryana", questionou o político durante a coletiva.

As acusações envolvem o partido do primeiro-ministro Narendra Modi (BJP) e a Comissão Eleitoral indiana, que são acusados de manipulação nas eleições do ano passado no Estado de Haryana. Ambos negam as alegações.

Vida profissional afetada pela fama indesejada

No Brasil, a situação desencadeou uma verdadeira enxurrada de mensagens para a cabeleireira. "As pessoas começaram a me marcar, algumas a me chamar no direct do Instagram. Eu falei: gente, que loucura é essa?", relatou Nery.

A profissional precisou recorrer ao Google Tradutor para entender as inúmeras mensagens em hindi e outras línguas indianas. Quando compreendeu a dimensão do caso, sentiu medo. "Parece algo com uma grande dimensão fora do Brasil. Não sei se era perigoso para mim ou não", confessou.

A repercussão afetou diretamente seu trabalho no salão de beleza em Belo Horizonte. "Hoje não vim de manhã, só à tarde. Pela quantidade de mensagens, não conseguia ver as das minhas clientes. Muito jornalista ligando", explicou.

A situação chegou a incomodar seu chefe, obrigando-a a remover o nome do salão de seu perfil nas redes sociais. "Tive que tirar o nome do salão do meu perfil porque estavam importunando o meu trabalho e meu chefe chamou atenção", revelou.

Origem da foto e alerta sobre imagens online

A história da fotografia original começa em 2017, quando Matheus Ferrero, publicitário e amigo de Larissa, então com 33 anos, a convidou para um ensaio fotográfico profissional. Ela, que não era modelo, inicialmente recusou, mas acabou aceitando participar.

As fotos foram realizadas em Belo Horizonte e Matheus decidiu enviar uma das imagens para sites de fotografia, buscando visibilidade para seu trabalho. A foto viralizou, alcançando mais de 57 milhões de visualizações, mas ele nunca recebeu pagamento pelo uso da imagem.

Com a recente repercussão, Matheus removeu todo o material da internet e bloqueou suas redes sociais por receio. "Apaguei por receio, já que a foto foi usada de forma indevida. Não é algo que me representa mais. E fiquei com medo de usarem fotos de outras pessoas que fotografei", explicou.

Larissa deixou um alerta sobre os riscos de publicar imagens pessoais online: "Tomem cuidado com as fotos que vocês postam. A gente é a primeira geração que está lidando com isso. Fiz uma foto em 2017, jovem, no muro da frente da minha casa. Achei que nunca ia dar em nada. E olha onde fui parar. Minha cara está nos telões da Índia, do outro lado do mundo".

A BBC News Brasil verificou uma série de evidências que comprovam a autoria de Matheus Ferrero, incluindo outros ângulos do mesmo ensaio fotográfico e publicações originais de 2017 em perfis privados do Facebook.