Programa de auxílio estudantil beneficia alunos de alto padrão em cidade do interior paulista
Uma investigação do Fantástico revelou que 25 estudantes de famílias de alta renda em Indaiatuba, no interior de São Paulo, receberam R$ 513 mil em recursos públicos de um programa destinado a pessoas em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Os valores foram pagos pelo programa municipal Passe Bolsa, que completa 20 anos de existência.
O programa, criado em 2005, prevê reembolso de mensalidades para alunos "em situação socioeconômica desfavorável" matriculados em cursos superiores ou técnicos. A legislação estabelece claramente que o benefício não pode ser concedido a estudantes de segunda graduação e pós-graduação, além de exigir comprovação de necessidade financeira.
Casos que chamaram a atenção
Entre os beneficiários identificados pela reportagem está Ísis Furlan, formada em administração e atualmente cursando medicina. Ela recebeu R$ 55 mil do programa municipal. Nas redes sociais, a estudante compartilha viagens internacionais, incluindo estágio no Japão, e atende em uma clínica de estética de alto padrão.
Quando questionado pela reportagem, o pai da estudante defendeu o recebimento do benefício: "Desde quando só pessoas vulneráveis têm direito a alguma bolsa?" Ele ainda afirmou: "Eu conheço milhares de pessoas na minha toda que recebeu bolsa que se for ver direitinho nem teria direito".
Outro caso é o de Samya Arthuzo, também estudante de medicina, que recebeu quase R$ 33 mil entre 2024 e 2025. A jovem mora em um condomínio onde as casas são avaliadas entre R$ 5 milhões e R$ 7 milhões. Sua mãe é procuradora do município de Salto e recebe salário mensal de R$ 41 mil.
Já Luana Scallet, aprovada para receber o auxílio em 2025, vive em uma casa grande em condomínio fechado e seus pais são proprietários de uma das principais imobiliárias da cidade. Mesmo com registros de viagens à Argentina, Uruguai e Itália nas redes sociais, ela recebeu R$ 10.145 em reembolsos nos primeiros meses de 2025.
Reação da prefeitura e investigações
O prefeito Custódio Tavares Dias Neto (MDB) informou ao Ministério Público que realiza um levantamento para identificar pagamentos indevidos. A prefeitura afirmou que em 2024 identificou inconsistências no programa e que a servidora responsável pela análise das concessões foi demitida.
Os "beneficiários irregulares foram notificados para devolver valores recebidos", segundo a administração municipal. O secretário de Negócios Jurídicos, Tiago, declarou que precisa "definir se é um erro do servidor ou se é uma má prestação de informações por parte do beneficiário".
Os números totais do programa entre 2023 e julho deste ano são:
- 170 estudantes receberam recursos do Passe Bolsa
- R$ 967 mil foi o total pago no período
- R$ 513 mil (53% do total) foi para os 25 alunos com indícios de não precisarem do benefício
Um promotor ouvido pela reportagem questionou o conceito de vulnerabilidade aplicado nos casos: "Se a prefeitura não ajudasse ela a pagar a faculdade de medicina, ela conseguiria estudar? Ah, ela conseguiria mesmo assim. Então você começa a fazer qual é o conceito de vulnerabilidade".
