Ditadura: Famílias de Sorocaba Recebem Certidões que Contam a Verdade Sobre Mortes
Sorocaba: certidões revelam mortes na ditadura

Era uma dessas manhãs que pareciam comuns, mas que carregavam um peso histórico difícil de mensurar. Em Sorocaba, algumas famílias respiravam fundo enquanto seguravam nas mãos um pedaço de papel que demorou quase meio século para chegar. Não era um documento qualquer — era a verdade, finalmente reconhecida oficialmente.

Oito certidões de óbito foram retificadas, trocando aquelas velhas e vagas explicações por uma única e dolorosa verdade: morte violenta causada pelo Estado brasileiro. Sim, o próprio Estado que deveria proteger seus cidadãos.

O peso das palavras

Parece pouco? Quem pensa assim nunca teve que conviver com a angústia de não saber exatamente como um ente querido partiu. As certidões originais — quando existiam — falavam em "causas indeterminadas" ou "mortes naturais". Como se alguém pudesse morrer naturalmente após ser preso por agentes do governo.

O trabalho da Comissão da Verdade "Rubens Paiva" foi fundamental nesse processo. Eles escavaram arquivos, ouviram testemunhas e juntaram provas que não deixavam margem para dúvidas. A verdade, ainda que tardia, começava a vir à tona.

Nomes que voltam da sombra

Entre as vítimas reconhecidas estão:

  • Alcides Alves da Silva
  • Dimas Casemiro
  • Estevão Aparecido de Almeida
  • Evaldo Luiz Ferreira de Carvalho
  • João Carlos de Souza
  • José Marciliano Gomes da Costa
  • Luiz Gonzaga das Virgens
  • Manoel de Matos

Cada nome representa uma história interrompida, uma família marcada pelo luto sem explicação. E agora, finalmente, um reconhecimento oficial do que realmente aconteceu.

O que mais choca — pelo menos para mim — é que algumas dessas mortes aconteceram bem aqui, em Sorocaba. Não foram em algum lugar distante, em quartéis isolados, mas aqui mesmo, na nossa cidade. Isso dá uma dimensão completamente diferente à história.

Um alívio que chega tarde, mas chega

Conversando com parentes das vítimas, dá para perceber que a emoção é contraditória. Há alívio, sim, mas também uma revolta que nunca desapareceu completamente. "Agora está escrito", disse um deles, com a voz embargada. Como se aquelas palavras no documento finalmente validassem décadas de dor.

E pensar que isso só foi possível graças ao trabalho persistente de organizações de direitos humanos e do próprio Ministério dos Direitos Humanos. Eles não deixaram que essas histórias fossem esquecidas nos arquivos empoeirados.

A verdade tem dessas coisas — ela insiste em aparecer, mesmo quando tentam escondê-la por anos, décadas. Pode demorar, mas chega. Como diz o ditado, uma mentira pode viajar o mundo inteiro enquanto a verdade ainda está calçando os sapatos. Mas ela sempre acaba chegando.

Para Sorocaba, esse é mais um capítulo — doloroso, mas necessário — no processo de entender sua própria história. E para as famílias, um pequeno passo na longa jornada por justiça completa.