Gisele Pelicot Retorna ao Tribunal: A Luta que Destruiu sua Família e Virou Símbolo Contra Estupro
Gisele Pelicot: símbolo contra estupro volta ao tribunal

Quase dez anos se passaram, mas a dor permanece viva. Gisele Pelicot, um nome que ecoa além dos tribunais, prepara-se para mais um capítulo em sua jornada judicial — uma batalha que custou sua família, sua paz, mas não sua voz.

O que acontece quando um crime não só viola seu corpo, mas destrói cada alicerce de sua vida? Gisele sabe a resposta na pele. E carrega nas costas o peso de ter se tornado, quase que por acaso, um símbolo nacional na luta contra a violência sexual.

O preço de buscar justiça

Em 2016, um estupro coletivo chocou o país. Gisele, então com 37 anos, foi atacada por três homens dentro de um carro após aceitar uma carona. O que veio depois foi quase pior que o crime em si.

Seu casamento não resistiu. "A família que eu conhecia desmoronou", conta ela, com aquela voz que mistura cansaço e determinação. O ex-marido, incapaz de lidar com as consequências, partiu. A vida reconstruída pedaço por pedaço agora inclui uma solidão que ela não escolheu.

Por que voltar à cena do crime?

Na próxima terça-feira, Gisele retorna ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Não é por falta de vontade de seguir em frente — é porque a justiça, essa entidade caprichosa, ainda não terminou seu trabalho.

Dois dos três agressores seguem respondendo em liberdade. Sim, você leu certo. Enquanto Gisele vive com as sequelas diárias do trauma, eles circulam pelas mesmas ruas, respiram o mesmo ar.

O caso é complexo — cheio de idas e vindas que testariam a paciência de um santo. Recursos, apelações, uma dança jurídica que parece não ter fim. E no centro disso tudo, uma mulher que se recusa a ser silenciada.

Quando uma vítima vira símbolo

Algo curioso — e profundamente triste — aconteceu com Gisele. Sem planejar, sem querer, ela se transformou na face visível de milhares de mulheres que sofrem em silêncio.

"As pessoas me param na rua", ela revela. "Me abraçam. Contam suas próprias histórias. Histórias que carregam há anos, décadas às vezes."

Essa solidariedade inesperada trouxe um tipo diferente de peso. O peso da representatividade. Quando você vira símbolo de algo, cada passo, cada palavra, cada decisão deixa de ser apenas sua.

O que esperar do próximo capítulo?

Os olhos do movimento feminista e de defensores dos direitos humanos estarão voltados para Porto Alegre. Não é só sobre Gisele — é sobre o que seu caso representa para todas as mulheres que buscam justiça em um sistema que frequentemente as falha.

Os advogados dela preparam novos argumentos. Novas provas. Novas tentativas de fazer com que a lei enxergue o que todos já veem: que crimes sexuais não podem ser tratados como infrações menores, como deslizes a serem esquecidos.

Enquanto isso, Gisele segue sua vida. Trabalha, cuida de si, tenca reconstruir o que foi quebrado. Mas toda terça-feira judicial é um lembrete cruel — da violência, da perda, da batalha interminável.

O legado de uma luta solitária

O que resta quando a poeira baixar? Seja qual for o desfecho legal, Gisele Pelicot já deixou sua marca. Sua coragem em falar abertamente — nomeando seus agressores, enfrentando o estigma — inspirou mudanças reais.

Mais mulheres denunciam. Mais pessoas discutem consentimento. Mais olhos vigiam o sistema judicial.

Mas o preço? Ah, o preço foi alto demais. Uma família desfeita. Anos de terapia. Noites sem dormir. E essa sensação constante de estar sempre à espera da próxima batalha.

Na terça-feira, ela entra no tribunal mais uma vez. Sozinha, mas representando muitas. Ferida, mas não derrotada. Sua história — dura, complexa, humana — continua sendo escrita.