
Eis um paradoxo que vai fazer você coçar a cabeça: o brasileiro nunca teve tanta grana no bolso — mas também nunca esteve tão longe de realizar o sonho da casa própria. Que coisa, não?
Dados fresquinhos do IBGE, divulgados nesta quinta-feira, pintam um retrato curioso do nosso país. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) mostrou que a renda média do trabalhador deu um salto. Um salto mesmo! Só que, em um movimento quase contraditório, a posse da casa própria... bem, não acompanhou esse ritmo.
O que os números mostram?
A realidade é nua e crua. A taxa de domicílios próprios no Brasil — aqueles que são de fato dos moradores — caiu. Caiu para 61,8%. Pode não parecer muito, mas é a menor marca já registrada desde que o estudo começou a ser feito, lá em 2016. Uma quebra de recorde nada animadora.
E o aluguel? Ah, esse virou a opção de milhões. A fatia de lares pagando aluguel subiu para 21,4%, o maior patamar da série histórica. Uma mudança de comportamento e tanto para uma cultura que sempre venerou a ideia de ter um teto só seu.
Mas como assim? Se a renda aumentou, por que não compramos casa?
Pois é, a pergunta que não quer calar. Os especialistas apontam o dedo para um vilão bem conhecido: o custo dos imóveis. Sim, o preço das casas e apartamentos disparou de uma forma que deixou o aumento dos salários no chinelo. Uma corrida perdida.
Não bastasse isso, o crédito — aquele amigo que facilita a compra — está mais caro e mais difícil. Juros altos e critérios apertados fecham a porta para muita gente que, teoricamente, poderia entrar no mercado.
E tem mais um detalhe, um tanto sutil: com mais dinheiro, as pessoas passaram a buscar moradias melhores. Melhores localizações, condomínios com mais estrutura, apartamentos um pouco maiores. E esse upgrade de vida, muitas vezes, só é possível no aluguel. É um trade-off entre qualidade imediata e investimento a longo prazo.
Não é só um problema de wallet
Olhando mais de perto, a história fica ainda mais complexa. A queda na propriedade foi puxada, principalmente, pelas Regiões Metropolitanas. São Paulo, Rio, Belo Horizonte... nesses centros urbanos fervilhantes, o preço do metro quadrado é um absurdo. Quem nasceu ali, muitas vezes, é expulso para a periferia ou aceita o aluguel como única saída para não deixar a cidade.
E aí entra outro fator social: a mobilidade. Gerações mais novas parecem valorizar menos a posse definitiva de um imóvel. A flexibilidade de poder se mudar para outro bairro — ou outra cidade — por causa de um emprego pesa na hora da decisão. Prender-se a uma hipoteca de 30 anos? Talvez não faça mais tanto sentido.
O resultado disso tudo? Um Brasil que melhorou seu padrão de vida, mas que viu seu sonho mais tradicional — o de ter seu cantinho — se distanciar. Um avanço que, paradoxalmente, vem acompanhado de uma certa dependência. Afinal, todo fim de mês, a conta do aluguel chega.