Três dos maiores nomes da música brasileira - Caetano Veloso, Marisa Monte e Marina Sena - uniram forças em uma campanha histórica pela regulamentação do uso da inteligência artificial no setor artístico e musical do país.
Campanha por transparência e remuneração justa
A iniciativa é liderada pela União Brasileira de Compositores (UBC) e pela Pró-Música Brasil, entidades que representam compositores e a indústria fonográfica. O movimento tem como princípio fundamental que "toda criação tem dono" e que "quem usa paga".
Segundo os organizadores, o objetivo central é garantir que a revolução da inteligência artificial aconteça com transparência, remuneração justa e respeito aos criadores. A campanha defende que a tecnologia deve caminhar junto com os artistas, e não se sobrepor a eles.
Principais demandas da campanha
Os artistas e entidades cobram um marco regulatório que exija:
- Transparência das ferramentas de IA e grandes plataformas
- Declaração obrigatória do uso de obras protegidas em treinamentos
- Contratos ou pagamento de licenças quando houver utilização
- Direito de autores permitirem ou proibirem uso de suas obras
- Clareza total sobre fontes utilizadas e como as criações são usadas
- Participação nos lucros quando músicas alimentam algoritmos
Brasil como alvo preferencial da IA
A riqueza e diversidade da produção cultural brasileira transformaram o país em um verdadeiro pote de ouro para o treinamento de IA generativa. Uma reportagem do jornal Folha de S.Paulo revelou que pelo menos três empresas americanas utilizaram livros de autores brasileiros para treinar seus sistemas sem autorização ou pagamento, recorrendo a cópias piratas disponíveis na internet.
Especialistas classificam essa prática como "extrativismo de dados", um fenômeno que preocupa criadores em todo o mundo.
Panorama internacional da regulamentação
Países e organizações internacionais correm para estabelecer diretrizes que protejam os criadores sem prejudicar o desenvolvimento da indústria. As discussões incluem diferentes abordagens:
- Autorização prévia dos detentores de direitos autorais
- Modelos de remuneração coletiva
- Sistemas de "opt-out" onde autores precisam se manifestar contra o uso
- Defesa do "fair use" para treinamento de IA
A União Europeia saiu na frente com seu "AI Act", publicado em julho do ano passado, após primeira versão apresentada em 2021. A legislação determina que provedores de modelos de IA devem disponibilizar publicamente um resumo detalhado sobre o conteúdo usado no treinamento das ferramentas.
Situação no Brasil
No âmbito nacional, foi criada em abril a Comissão Especial sobre Inteligência Artificial na Câmara dos Deputados, que discute o Projeto de Lei 2338/23, conhecido como PL da IA. O texto inclui uma seção dedicada aos direitos autorais que segue direção similar à europeia.
O artigo 62 do projeto estabelece que "o desenvolvedor que utilizar conteúdo protegido por direitos de autor e conexos deverá informar sobre os conteúdos protegidos usados nos processos de desenvolvimento dos sistemas de IA". A mineração de dados é permitida para instituições de pesquisa, educacionais, museus, arquivos públicos e bibliotecas, desde que sem fins comerciais e com acesso feito de forma lícita.
O movimento liderado por Caetano Veloso, Marisa Monte e Marina Sena representa um marco importante na defesa dos direitos dos criadores brasileiros na era digital, alertando para a necessidade de equilíbrio entre inovação tecnológica e proteção à produção cultural nacional.