De forma discreta, porém decidida, as jovens da Geração Z estão transformando o guarda-roupa em um campo de batalha pela autonomia. O ato de abandonar o sutiã, longe de ser apenas uma escolha de moda ou conforto, consolidou-se como um gesto político cotidiano, uma afirmação estética e de liberdade sobre o próprio corpo.
Das ruas ao tapete vermelho: um símbolo de autenticidade
Seja nas redes sociais, no ambiente de trabalho ou em eventos de gala, a decisão de não usar a peça íntima e permitir que os seios sejam vistos sob tecidos finos tornou-se um símbolo potente de autenticidade. A tendência, que cresce rapidamente, proclama um direito básico: cada pessoa deve se vestir (ou não) como bem entender.
As raízes recentes desse movimento remontam a 2012, quando a diretora Lina Esco lançou o filme e a campanha "Free the Nipple". O objetivo era combater a censura seletiva aos mamilos femininos. A iniciativa ganhou adeptos globalmente, mas também acirrou a oposição conservadora, resultando em episódios como prisões por "atentado ao pudor" em alguns estados dos EUA, mesmo onde a prática do topless era legal.
Obstáculos e o poder das celebridades
O caminho, no entanto, não foi simples. Uma das contradições mais evidentes ocorreu no ambiente digital. Plataformas como Facebook e Instagram mantiveram políticas que censuravam mamilos femininos enquanto permitiam os masculinos sem restrições, evidenciando um duplo padrão.
A virada para maior visibilidade veio com o apoio de figuras influentes. Em 2017, a atriz e cantora Zendaya foi fotografada usando a camiseta oficial do "Free the Nipple". Billie Eilish, que sempre usou roupas oversized para evitar a sexualização precoce, começou a explorar visuais com tecidos translúcidos. Mas foi a atriz britânica Florence Pugh quem se tornou a porta-voz mais evidente da onda.
Em 2022, ao usar um vestido rosa-choque transparente da Valentino, Pugh provocou reações misóginas. Sua resposta foi direta: "Como é que meus mamilos podem ofender tanto assim?", questionou. "É a liberdade que as pessoas temem, o fato de eu estar confortável e feliz." Ela destacou o cerne da questão: a vigilância constante sobre o corpo feminino, que é criticado quando aparece de forma natural, em contraste com a liberdade concedida aos homens.
O debate foi reaceso recentemente quando a atriz Sydney Sweeney usou um vestido transparente no evento Power of Women. A veterana Sharon Stone saiu em sua defesa, enquanto a própria Sweeney optou pelo silêncio. Para a pesquisadora e doutora em estudos de gênero Marina Costin Fuser, da Universidade de Sussex, "há ainda uma disputa cultural severa, com aspectos morais que servem para o mundo feminino, mas não para o masculino".
Do ato performático à mudança cultural silenciosa
É útil olhar para a história para entender a dimensão do presente. Nos anos 1960 e 1970, queimar sutiãs em praça pública era um ato performático máximo da contracultura feminista. Hoje, a abordagem é diferente. O gesto perdeu a pompa, mas não a força política.
As jovens da Geração Z talvez não estejam organizando fogueiras simbólicas. Em vez disso, estão, calmamente, deixando os sutiãs dobrados na gaveta no seu dia a dia. É uma rejeição silenciosa, porém constante, a padrões impostos.
O movimento indica um caminho de transformação social. Pode demorar, mas aponta para um futuro em que a exibição do corpo natural, sem a mediação de peças íntimas obrigatórias, não cause tanto incômodo. Será o dia em que, de peito aberto, as mulheres conquistarem de vez o direito de não pedir permissão para simplesmente existirem em seus corpos, com autenticidade e liberdade.