Terreiro de Jarê mais antigo do Brasil é tombado pelo IPHAN após 18 anos
Terreiro de Jarê mais antigo tombado pelo IPHAN

Uma importante vitória para a preservação da cultura afro-brasileira foi conquistada na última quarta-feira (26). O Terreiro Palácio de Ogum e Caboclo Sete-Serra, localizado em Lençóis, na Chapada Diamantina, recebeu o tombamento pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).

Uma batalha de 18 anos

O processo para o reconhecimento federal começou há exatamente 18 anos, em 2007, quando a Associação dos Filhos de Santo do Palácio de Ogum e Caboclo Sete-Serra enviou uma carta ao Escritório Técnico do IPHAN em Lençóis. A emoção tomou conta dos membros do terreiro, que comemoram nas redes sociais: "Vencemos! Um sonho, uma batalha de 18 anos, que agora se concretizou e se torna realidade demais".

Fundado em 1949 por Pedro Florêncio Bastos, conhecido como Pedro de Laura, este espaço sagrado possui uma característica singular. Diferente da tradição do Jarê, que normalmente fecha após a morte do líder fundador, o terreiro continua em pleno funcionamento devido a um pedido especial de seu fundador.

Significado do tombamento

O reconhecimento federal garante proteção contra destruição e demolição do terreiro. Além disso, qualquer trabalho de restauração ou modificação no local deverá ser previamente aprovado pelo instituto. A justificativa para o tombamento baseou-se na relevância cultural e histórica do espaço.

Segundo o IPHAN, o terreiro representa um testemunho da resistência e criatividade das populações negras na consolidação de seus territórios simbólicos e espirituais. A cerimônia de votação ocorreu em Brasília e contou com a presença do filho do fundador, Sandoval, e da prefeita de Lençóis, Vanessa Senna.

A gestora municipal destacou a importância histórica do reconhecimento: "Este tombamento é muito mais do que um reconhecimento: é a garantia de preservação de um patrimônio sagrado, cultural e ancestral que faz parte da alma de Lençóis e da Chapada Diamantina. É respeito à nossa história, às nossas tradições e aos povos que as mantêm vivas".

O terreiro e suas características

O Terreiro Palácio de Ogum e Caboclo Sete-Serra ocupa uma área de aproximadamente 3.782 m² e é composto por:

  • Uma casa principal chamada pagodô, onde acontecem as cerimônias e práticas rituais
  • Um espaço consagrado aos exus (caramanchão)
  • Outros ambientes cercados por vegetação nativa, árvores sagradas, pedras, cursos d'água e objetos enterrados

Considerado o templo de Jarê mais antigo ainda em funcionamento no Brasil, o espaço representa a resistência cultural e religiosa de tradições africanas no país.

O que é o Jarê?

O Jarê é uma religião de matriz africana típica da região da Chapada Diamantina, conhecida como um "candomblé de caboclos". Sua origem remonta à fusão de duas cerimônias distintas que aconteciam nas cidades de Andaraí e Lençóis.

A prática começou com mulheres africanas escravizadas vindas da Costa da Mina - região que hoje compreende Gana, Togo, Benim e Nigéria. Essas mulheres realizavam cerimônias religiosas dentro de casa e na língua iorubá, mas precisavam também prestar culto a entidades do lado de fora das residências.

Com o tempo, os dois tipos de celebração se fundiram, dando origem ao Jarê como é conhecido hoje, onde todas as entidades são reverenciadas no mesmo espaço sagrado.

O tombamento do Terreiro Palácio de Ogum e Caboclo Sete-Serra representa não apenas a preservação de um espaço físico, mas o reconhecimento da importância cultural e histórica das religiões de matriz africana para a formação da identidade brasileira.