Da Panela ao Poder: Professor da UFRJ Transforma Cozinha em Palco de Representatividade Negra
Cozinha como resistência: professor da UFRJ e representatividade

Numa dessas reviravoltas que só a vida sabe dar, a cozinha de um apartamento comum no Rio de Janeiro deixou de ser apenas lugar de fazer arroz e feijão. Wallace Lino, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, fez das panelas sua trincheira particular. E que trincheira!

O que começou como necessidade — cozinhar para si mesmo — virou movimento. Wallace percebeu que cada tempero, cada receita de família, carregava histórias que os livros didáticos ignoravam. Aí a ficha caiu: a cozinha era território político.

Mais Que Receitas: Memórias Vivas

Não se engane pensando que são só aulas de culinária. É bem mais profundo. Wallace resgata técnicas ancestrais, ingredientes que atravessaram o Atlântico nos porões dos navios negreiros e sobreviveram à diáspora. Tem cheiro de história nessas panelas, tem sabor de resistência.

"A gente não aprende na escola sobre a importância da culinária africana na formação do Brasil", reflete ele, enquanto mexe uma panela. "É como se metade da nossa história tivesse sido apagada — ou melhor, temperada sem os créditos devidos."

Da Academia ao Fogão

O interessante é ver como ele conecta coisas que, na superfície, parecem desconexas. A academia com a cozinha, a teoria com a prática pura. Nas suas oficinas — porque aulas seria termo pequeno demais — os participantes não só aprendem receitas, mas discutem racismo, representatividade e identidade.

Uma vez, conta Wallace, uma jovem negra chegou pra ele depois de uma oficina com os olhos brilhando: "Nunca imaginei que minha avó, lá na Bahia, estava fazendo ativismo toda vez que preparava um acarajé." São esses momentos que valem ouro.

O Sabor da Mudança

O projeto cresceu de forma orgânica, como fermento natural. Começou pequeno, entre amigos, e hoje recebe convites de várias partes. Wallace adaptou o formato para o online durante a pandemia — e descobriu que o digital pode ser tão acolhedor quanto uma cozinha física.

O que me faz pensar: quantos outros espaços domésticos poderiam se transformar em centros de resistência cultural? A sala, o quintal, a varanda... Wallace mostrou que não precisamos de palácios para fazer revoluções. Às vezes, um fogão de quatro bocas basta.

Enquanto muitos reclamam da falta de representatividade, esse professor-chef decidiu criar a própria. E faz isso com tanto sabor que é impossível não querer repetir o prato.