O cinema e o streaming estão revisitando um dos temas mais fascinantes da humanidade: a vida após a morte. Diferente das abordagens tradicionais que mostram céu e inferno, produções recentes apresentam visões criativas e surpreendentes sobre o que poderia existir depois da partida.
Eternidade: amor e escolhas no além
O filme Eternidade (Eternity, Estados Unidos, 2025), já em cartaz nos cinemas, apresenta uma concepção inovadora do pós-vida. A trama acompanha Larry, interpretado por Miles Teller, que após morrer engasgado desperta em um trem com aparência rejuvenescida.
No mundo espiritual, ele é recebido por uma consultora interpretada por Da'Vine Joy Randolph que lhe explica as regras desse novo universo. As opções de eternidade são diversas, incluindo cenários históricos como a Alemanha dos anos 1930 (sem nazistas), mundos nudistas ou até mesmo realidades no espaço sideral.
A complicação surge quando a esposa de Larry, Joan (Elizabeth Olsen), chega ao mesmo local e reencontra seu primeiro amor, Luke (Callum Turner), que a esperava há 67 anos. Assim se estabelece um triângulo amoroso que desafia as convenções sobre relacionamentos e eternidade.
Tradição e inovação nas telas
Esta abordagem criativa não é isolada. A série The Good Place, disponível em streaming, oferece uma visão igualmente original ao apresentar o além como um condomínio de classe média onde as pessoas se reúnem para tomar frozen yogurt.
Durante suas quatro temporadas, a produção questiona o sistema tradicional de recompensas e punições, mostrando um mecanismo de pontuação comportamental que determina o destino das almas. Os protagonistas eventualmente contestam esse sistema, considerado ultrapassado e injusto.
No Brasil, o cinema explora frequentemente a perspectiva espírita, como demonstra o sucesso Nosso Lar, que terá seu terceiro filme lançado em janeiro de 2027.
Raízes históricas e culturais
A fascinação pela vida após a morte tem raízes profundas na cultura ocidental, remontando à Divina Comédia de Dante Alighieri (1265-1321). A obra do poeta italiano estabeleceu o imaginário cristão sobre céu, purgatório e inferno que influenciou gerações de artistas.
Nos anos 1940, período marcado pelos horrores da Segunda Guerra Mundial, o cinema transformou o medo da morte em comédias reconfortantes. Clássicos como O Diabo Disse Não (1943) e Neste Mundo e no Outro (1946) ofereciam entretenimento como contraponto às dificuldades do período.
David Freyne, diretor de Eternidade, confessou em entrevista à VEJA: "Desde que eu vi estes filmes, sonhava em criar minha própria vida após a morte". Já Elizabeth Olsen, protagonista do filme, revelou sua perspectiva pessoal: "Eu admiro quem tem uma relação cultural com a vida após a morte. Fui obrigada a aceitar o que me ensinaram na igreja".
O que une essas produções é a ênfase na autonomia humana de fazer escolhas e defender desejos mesmo após a morte. A descoberta recorrente é que o "lado de lá" pode ser mais parecido com o "lado de cá" do que imaginamos, com romances, intrigas e sentimentos comuns se repetindo em ambas as realidades.
Como resume Freyne: "Para mim, o paraíso é o amor em suas várias formas. Espero que os espectadores reflitam não sobre a morte, mas sobre o que vale a pena em suas vidas". Que essas tramas do outro mundo continuem trazendo ensinamentos valiosos para nosso cotidiano.