Quatorze anos depois de causar furor nas telas do cinema nacional, Deborah Secco está de volta ao papel que marcou sua carreira. Aos 46 anos, a atriz revive Raquel, a prostituta que se tornou celebridade na internet como Bruna Surfistinha. As filmagens de "Bruna Surfistinha 2" já estão em andamento em São Paulo, prometendo uma continuação que dialoga com a era digital.
Uma Raquel para os novos tempos
A história do novo longa é fictícia, mas inspirada em elementos da realidade. Na trama, Raquel, que havia abandonado a prostituição no final do primeiro filme, enfrenta uma reviravolta e considera um retorno ao trabalho sexual. No entanto, o mundo mudou. O blog que a tornou famosa nos anos 2000 deu lugar a plataformas de conteúdo adulto como OnlyFans e Privacy, onde criadores monetizam vídeos e fotos explícitos para assinantes.
O filme original, lançado em 2011, foi um fenômeno de público e cultura, atraindo mais de 2 milhões de espectadores aos cinemas e gerando intensos debates sobre moralidade, exploração e sexualidade feminina. Baseado na história real de Raquel Pacheco, a garota de classe média alta que se tornou a famosa Bruna Surfistinha, o longa foi um marco por retratar a prostituição pela perspectiva da trabalhadora do sexo.
Debate atualizado e intimidade no set
Segundo Marcus Baldini, diretor do primeiro filme e da sequência, as preocupações sociais evoluíram. "Ajustamos o ponto de vista, porque as preocupações e discussões são diferentes", afirma. O avanço tecnológico e os debates feministas que ganharam força após 2011 serão incorporados à narrativa.
Uma mudança significativa nos bastidores é a presença de uma coordenadora de intimidade durante as cenas de sexo, uma prática que se tornou mais comum após o movimento MeToo. Deborah Secco, no entanto, ressalta que nunca se sentiu desconfortável durante as gravações do primeiro filme, pois todas as cenas tinham propósito narrativo.
O legado de um papel transformador
Aceitar o papel de Bruna Surfistinha em 2011 não foi uma decisão fácil para Secco. A atriz lembra que temia ser estereotipada e que sua carreira ficasse marcada para sempre. Ela chegou a consultar a mãe e cineastas de confiança, como Guel Arraes e Jorge Furtado, que aconselharam contra. Mesmo assim, aceitou o desafio.
O resultado catapultou sua carreira. Com "Bruna Surfistinha", ela acumulou prêmios de atuação, foi a celebridade mais citada pela imprensa em 2011 e viajou para Hollywood incentivada por Steven Spielberg. A personagem se tornou um ícone pop, algo que a atriz percebeu claramente ao comparecer ao baile da Vogue em 2023 caracterizada como Bruna e ser cercada por fãs. "Me senti como o Mickey na Disney", brinca.
Questionada se aceitaria o papel com mais facilidade nos dias de hoje, Secco é categórica: "Ainda não. Muitas coisas evoluíram, mas acho que estamos em uma onda de conservadorismo muito forte". Sua preocupação agora, além do trabalho, é sua filha de dez anos, e a dificuldade de protegê-la em um mundo que nem sempre é gentil com as mulheres.
Enquanto isso, em São Paulo, Raquel/Bruna volta a ganhar vida. Em uma cena já filmada, Deborah Secco, vestindo uma regata apertada, desce de uma esteira e acende um cigarro, reclamando: "Programa é o caralho, eu faço o que eu quero". A frase ecoa o espírito de uma personagem que, 14 anos depois, ainda tem muito a dizer.