No sul de Alagoas, um esforço conjunto entre iniciativa privada, cientistas e ambientalistas está reescrevendo a história de uma espécie ameaçada. O papagaio-chauá (Amazona rhodocorytha), ave típica da Mata Atlântica e vítima do tráfico ilegal, está sendo reintroduzido com sucesso na região de Coruripe, em um projeto que já devolveu à natureza cerca de 80 indivíduos.
Um santuário para o pau-brasil e agora para os papagaios
O cenário para essa importante ação de conservação é o Sítio Pau Brasil, uma reserva privada de aproximadamente 1.200 hectares mantida pelo grupo da Usina Coruripe. A área, reconhecida pela UNESCO como Posto Avançado de Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, abriga uma das maiores populações nativas de pau-brasil do país, árvore símbolo do Brasil que também enfrenta risco de extinção.
Bertholdino Teixeira Junior, gerente corporativo de Sustentabilidade da Usina Coruripe, explica a motivação: "Desde a fundação da empresa, que está completando 100 anos, nós já temos um DNA de preservação... O que está faltando nessa floresta? Ela é silenciosa. Então, chegamos à conclusão que, além de preservar a floresta, precisamos colocar mais vida nela".
Do resgate do tráfico à soltura monitorada
O projeto de reintrodução ganhou força há cerca de três anos, quando uma ação da Polícia Federal desmantelou uma quadrilha de traficantes de animais e apreendeu um grande número de filhotes de papagaio-chauá. Essas aves foram encaminhadas para a Fundação Lymington, que, com o apoio da empresa de gestão de resíduos BluestOne, iniciou um longo processo de reabilitação.
Alexandre Resende, Diretor de ESG & Sustentabilidade da BluestOne, detalha: "A BluestOne entrou nesse projeto desde o começo... Então, a gente ajudou a reabilitar esses animais e, depois, foi uma grande ação para conseguir trazer 60 papagaios para essa reintrodução".
As aves passaram por um rigoroso período de adaptação, recebendo alimentação com frutos e sementes da mata local e sendo treinadas para reconhecer alimentos disponíveis na natureza. Antes do início do projeto, havia registro de apenas quatro papagaios-chauá vivendo soltos em todo o estado de Alagoas, o que demonstra a criticidade da situação.
Estratégia das "sentinelas" garante sucesso
Uma parte crucial da metodologia envolve aves que, impossibilitadas de voar, permanecem em um viveiro dentro da reserva atuando como "sentinelas". Elas funcionam como um ponto de referência seguro para os indivíduos soltos. Luís Fábio Silveira, curador da seção de aves do Museu de Zoologia da USP e gestor científico do Projeto Arca, esclarece a função: "Quando um papagaio-chauá ou um grupo de papagaios estiver pela floresta, elas servem como satélites... sempre vai ter comida no viveiro, sempre vai ter papagaio no viveiro, para que eles possam, devagarinho, começar a explorar e ocupar a floresta de novo".
A mais recente ação do projeto soltou mais 20 papagaios-chauá diretamente no Sítio Pau Brasil. O momento, acompanhado por biólogos, representantes de órgãos ambientais e moradores, simbolizou a reconquista de um espaço histórico por parte da espécie.
Em Coruripe, a beleza das praias e do Pontal agora divide os holofotes com uma iniciativa que prova que a conservação da biodiversidade é um pilar essencial para o desenvolvimento regional. O retorno dos papagaios-chauá à Mata Atlântica alagoana não é apenas uma vitória ecológica, mas um passo concreto para que o bioma, tão ameaçado, volte a pulsar com toda a sua vida e sons originais.