Uma expedição científica inédita está desvendando os segredos das onças-pintadas que habitam as áreas costeiras remotas do Amapá. Pesquisadores do projeto Onças do Amapá deram início a um amplo mapeamento desses felinos em três unidades de conservação ambiental de difícil acesso: o Parque Nacional do Cabo Orange, a Estação Ecológica Maracá-Jipioca e a Reserva Biológica do Lago Piratuba.
Desafios e estratégias de um estudo pioneiro
Esta é a primeira pesquisa do tipo realizada no litoral amapaense e terá duração de três anos. A iniciativa integra o projeto Amazônia +10, financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e desenvolvido pela Universidade Federal do Amapá (Unifap). O objetivo central é coletar informações detalhadas sobre a biodiversidade e a genética das onças, criando um banco de material biológico para estudos futuros.
A coordenadora do projeto, a bióloga Fernanda Michalski, explica que a escolha por áreas pouco exploradas foi estratégica. "Estamos trabalhando especialmente nas regiões da costa do Amapá que são poucos estudadas", afirma. Ela destaca que essas são áreas sob análise para potencial exploração de petróleo, onde há grande carência de conhecimento sobre a fauna local. "Da própria questão da onça-pintada: onde elas estão?", questiona a pesquisadora, enfatizando a importância do trabalho.
Metodologia e equipe em terrenos hostis
O estudo enfrenta grandes desafios logísticos devido ao terreno. Em alguns trechos, os pesquisadores precisam caminhar mais de 15 quilômetros para chegar às áreas de monitoramento, enfrentando marés, clima adverso e a densa vegetação. "É uma área de acesso muito difícil. Poucas pessoas estiveram lá justamente por causa da distância. É um lugar desafiador para estudar", reforça Michalski.
A pesquisa conta com uma equipe de 17 doutores, sendo 16 de instituições brasileiras — incluindo o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) — e um pesquisador da Guiana Francesa. A metodologia combina três frentes principais:
- Instalação de armadilhas fotográficas em árvores (iniciada em setembro).
- Análises genéticas de amostras coletadas.
- Diálogo e colaboração com comunidades ribeirinhas tradicionais.
A proposta é observar o comportamento das onças sem interferir em seu habitat e compreender como as populações tradicionais convivem com o animal.
Ecossistemas únicos e a importância da conservação
No Amapá, as onças-pintadas vivem em ecossistemas variados e sensíveis que estão sendo analisados pela pesquisa:
Parque Nacional do Cabo Orange: Criado em 1980, é uma das principais áreas de conservação do estado, localizado na fronteira com a Guiana Francesa. Protege manguezais, restingas e áreas costeiras, com acesso feito a partir do município de Oiapoque.
Estação Ecológica Maracá-Jipioca: Formada por ilhas costeiras e criada há mais de 40 anos, é considerada um dos maiores patrimônios naturais do Amapá, protegendo ecossistemas de grande relevância científica.
Reserva Biológica do Lago Piratuba: Com mais de 350 mil hectares, funciona como um laboratório natural para pesquisas e uma barreira contra a degradação ambiental, protegendo ecossistemas frágeis e espécies ameaçadas.
A onça-pintada é um símbolo da biodiversidade amazônica, e sua conservação é vista como essencial para proteger culturas tradicionais e garantir serviços ambientais que sustentam a vida humana. Nesta fase, os pesquisadores começam a recolher as câmeras instaladas na floresta. As imagens serão analisadas e os dados obtidos devem embasar a criação de políticas públicas voltadas para o ecoturismo e o desenvolvimento sustentável das comunidades da região.