Enquanto humanos planejam viagens de fim de ano, uma viajante incansável da natureza embarca em uma jornada épica sem bagagens, apenas com asas. A borboleta-monarca (Danaus plexippus) realiza uma das migrações mais impressionantes do reino animal, percorrendo centenas de quilômetros com precisão milimétrica.
O ciclo migratório das monarcas
De acordo com o professor André Freitas, do Departamento de Biologia Animal da Unicamp, o fenômeno segue um ritmo sazonal preciso. Durante o inverno, populações da espécie se concentram em áreas de invernada nas montanhas do México ou da Califórnia.
A migração tem início em março, quando as temperaturas sobem. As borboletas deixam seus refúgios e iniciam uma longa jornada rumo ao norte, com destino ao Canadá. No caminho, param para se reproduzir, depositando ovos que darão origem à próxima geração.
Durante a primavera e o verão, sucessivas gerações ajudam a expandir a população, alcançando regiões cada vez mais ao norte. O retorno ocorre entre setembro e novembro, com a última geração – nascida no Canadá – fazendo a longa viagem de volta às áreas de invernada originais.
Um fenômeno frágil e único
"As monarcas que se desenvolvem no Canadá podem atravessar toda a América do Norte", explica Freitas. "Chegam praticamente ao limite de sua capacidade física. Muitos indivíduos ficam extremamente exaustos, já que se alimentam pouco ao longo da viagem".
Qualquer perturbação durante essa jornada crítica pode ser determinante. O gasto desnecessário de energia pode impedir que completem o trajeto de volta, comprometendo todo o ciclo migratório.
"A monarca provavelmente não será extinta, mas o fenômeno migratório que conhecemos hoje pode desaparecer completamente se as áreas onde elas passam o inverno forem perturbadas ou modificadas", alerta o especialista.
Importância ecológica e reflexão filosófica
Embora não seja uma polinizadora de destaque para plantas alimentícias humanas, a borboleta-monarca tem grande importância ecológica. Suas lagartas servem de alimento para inúmeros insetos, aracnídeos e outros animais, sustentando a base de muitas cadeias alimentares.
Para Ciro Porto, jornalista e apresentador do Terra da Gente, a jornada da monarca transcende a biologia. "É um exemplo da natureza que mostra que a borboleta não viaja por ela, mas com a finalidade de ser parte de algo maior", reflete.
"No caso da monarca, ela viaja, migra e morre para servir de alimento a outras espécies. Fazer parte de algo maior é um grande desafio para o ser humano, enquanto, no ambiente natural, percebemos que é comum", complementa Porto.
Características da espécie
A borboleta-monarca é típica de ambientes abertos e pode ser encontrada em:
- Jardins
- Bordas de florestas
- Pastos abandonados
- Terrenos baldios
- Outras áreas de vegetação ampla
Seu ciclo de vida inclui:
- Ovo: dura cerca de uma semana
- Lagarta: pouco mais de um mês (podendo ser 20 dias em períodos quentes)
- Pupa: aproximadamente mais uma semana
- Adulto migrante: vive de seis a nove meses
- Gerações de verão: vivem de duas semanas a dois meses
O adulto é nectarívoro, alimentando-se do néctar das flores, enquanto as lagartas consomem plantas da família Asclepiadaceae.
"Essa jornada migratória única tem muita importância, porque não existe nada igual no planeta envolvendo borboletas", finaliza Freitas. "Tem toda uma relação com a história geológica e climática do planeta. Isso é lindo e um fenômeno biológico único".