Há mais de uma década, um projeto comunitário desenvolvido às margens do Rio Cassiporé, em Oiapoque, no extremo norte do Amapá, trabalha incansavelmente para preservar e repovoar espécies de tartarugas e tracajás na região amazônica.
Um legado de preservação
Liderado por Raimundo Benedito Miranda, de 69 anos, morador da Vila Velha do Cassiporé, a iniciativa começou em 2008 e já alcançou a marca impressionante de 20 mil filhotes devolvidos à natureza. O trabalho surgiu da preocupação de Benedito com o desaparecimento gradual dessas espécies na região.
"Minha família sempre me ajudou a realizar esse trabalho de incubação que já dura tanto tempo. No primeiro ano soltamos mais de 600 desses animais", conta Raimundo, cuja dedicação se tornou referência na comunidade.
O processo de conservação
O método desenvolvido pela família Miranda envolve coleta cuidadosa dos ovos, incubação controlada e posterior soltura dos filhotes. Em 2025, mais de 2 mil ovos de tracajás foram coletados, demonstrando a escala do projeto.
Os ciclos de desenvolvimento das espécies são respeitados rigorosamente: os filhotes de tracajá levam de 50 a 60 dias para nascer, enquanto os de tartaruga eclodem entre 45 e 50 dias. Após este período, os animais são transferidos para o berçário e, quando prontos, soltos no rio.
"Vamos em campos, prainha e coletamos os ovos. É com ajuda de cunhado, primos e de outros parentes que fazemos isso. As tartarugas precisam de um cuidado antes de serem devolvidas à natureza. Temos que proteger das chuvas, de outros animais também", explica Raimundo.
Desafios e conquistas
O projeto não nasceu sem obstáculos. A primeira ideia de incubar os ovos atrás de uma escola foi rejeitada por parte da comunidade, obrigando Benedito a adaptar o quintal de sua própria casa para dar continuidade ao trabalho.
Jandira Miranda, irmã de Benedito, destaca que os resultados vão além da preservação animal: "É muito importante o trabalho do meu irmão para preservar esses animais. Se ele não fizesse isso, não teria a quantidade que existe hoje. Muita gente não tem essa consciência, só querem destruir o que já existe".
Educação ambiental como pilares
Além da soltura dos animais, o projeto se consolidou como importante ferramenta de educação ambiental. Estudantes da região participam ativamente das atividades, viajando de voadeira até o local para acompanhar todo o processo de preservação.
Esse manejo comunitário é apontado como essencial para aumentar a população desses animais nos rios da Amazônia, criando um modelo sustentável que une conhecimento tradicional e conservação ambiental.
O trabalho persistente de Raimundo Miranda e sua família demonstra como ações locais podem gerar impactos significativos na preservação da biodiversidade amazônica, inspirando novas gerações a cuidar do patrimônio natural da região.