Racismo ambiental e trabalho sexual masculino: a dura realidade de sobrevivência no Recife
Racismo ambiental e trabalho sexual no Recife

No Recife, o sol castiga igual para todos, mas as sombras são desiguais. Um estudo recente escancarou o que muitos preferem ignorar: o racismo ambiental está empurrando homens negros para o trabalho sexual como último recurso de sobrevivência. Não é exagero, é matemática social perversa.

Quem circula pelo centro da cidade à noite vê cenas que desafiam os discursos oficiais. Homens — majoritariamente negros, periféricos — negociam seus corpos não por luxo, mas por necessidade. "É isso ou passar fome", confessa um deles, que pede para não ser identificado. Sua voz tremula entre o orgulho ferido e a resignação.

O peso geográfico da exclusão

Os pesquisadores mapearam um padrão cruel: quanto mais distante das áreas nobres, maior a incidência desse fenômeno. Bairros como Coqueiral e Brasília Teimosa surgem como epicentros dessa realidade. A falta de políticas públicas cria desertos de oportunidades — e o corpo vira moeda de troca.

  • 62% dos entrevistados relataram ter começado antes dos 25 anos
  • 88% são negros ou pardos
  • 73% citaram a falta de emprego formal como principal motivação

"A gente fala tanto em sustentabilidade, mas esquece que seres humanos também são parte do ambiente", provoca a antropóloga Clara Mendes, coordenadora da pesquisa. Seu tom indignado revela décadas de estudo sobre exclusão urbana.

Quando o rio vira fronteira

O Capibaribe — que deveria unir — acaba separando. De um lado, os prédios espelhados do Recife Antigo. Do outro, as vielas onde o asfalto nunca chega. Essa divisão hidrográfica reflete abismos sociais que poucos se dispõem a atravessar.

Às 3h da manhã, quando os últimos turistas deixam os bares da Boa Vista, é possível ver jovens atravessando a ponte no sentido inverso. Voltam para casa com o bolso menos vazio, mas com a alma mais pesada. "Se tivesse opção, escolheria outro caminho", murmura um deles, esfregando os olhos cansados.

O estudo — que levou 18 meses para ser concluído — aponta soluções possíveis, mas nada simples: desde políticas de requalificação urbana até programas de inserção profissional específicos. Enquanto isso, a cidade dorme sobre esse paradoxo: condena o que ela mesma cria.