A Polícia Civil de Minas Gerais indiciou dois garçons pelo crime de feminicídio após a morte de Alice Martins Alves, uma mulher trans de 33 anos. O espancamento fatal ocorreu no dia 23 de outubro, na região da Savassi, em Belo Horizonte, e teve como estopim o não pagamento de uma conta de R$ 22 em um bar. A vítima faleceu em 9 de novembro devido a complicações das lesões sofridas.
Brutalidade com motivação transfóbica
De acordo com a delegada Iara França, responsável pelas investigações, o crime foi marcado por uma brutalidade excessiva, com um claro pano de fundo de transfobia. Os agressores perseguiram, encurralaram e cercearam a liberdade de Alice, em uma ação que, segundo a autoridade, foi "exclusiva e autônoma" dos dois funcionários do estabelecimento.
"Existiu essa motivação transfóbica como pano de fundo para essa agressão ter sido de forma mais brutal contra Alice. Esses autores perseguiram ela, encurralaram ela... O interesse deles era realmente punir a Alice pela questão da identidade de gênero dela", afirmou a delegada em coletiva realizada na quinta-feira (4).
Gritos de socorro e a intervenção de um herói
As câmeras de segurança do local registraram os momentos de terror. Nos vídeos, é possível ouvir Alice gritar "socorro" ao menos quatro vezes e, em seguida, suplicar por ajuda. As agressões só cessaram graças à intervenção corajosa de um motoboy que passava pelo local e ouviu os apelos desesperados.
Um diálogo captado pelas câmeras mostra um dos agressores tentando afastar o motociclista, que respondeu com firmeza: "Bater nos outros é fácil". A Polícia Civil destacou que, sem essa intervenção, Alice teria morrido no local. O entregador interrompeu a violência e chamou o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu).
Trajetória de sofrimento e a perda irreparável
Após o ataque, Alice foi atendida na UPA Centro-Sul e liberada. No entanto, seu estado se agravou rapidamente. Ela registrou a ocorrência no dia 5 de novembro e foi submetida a exame de corpo de delito. Segundo relatos da família, a vítima perdeu 12 quilos, desenvolveu uma úlcera no estômago e acabou falecendo em decorrência de um choque séptico.
O pai de Alice, Edson Alves Pereira, compartilhou a dor da perda. "Ela estava com nariz sangrando, boca arrebentada, morrendo de dor... Aí de lá pra cá foi só sofrimento. Ela foi decaindo, a saúde dela piorando... e acabou que veio a óbito", lamentou. Alice foi velada e enterrada no Cemitério Parque da Colina, em Belo Horizonte, no dia 10 de novembro.
Investigados têm histórico criminal e prisão foi solicitada
As investigações do Departamento Estadual de Investigação de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) revelaram que um dos garçons, de 27 anos, já tinha passagens pela polícia por roubo e uso de drogas. Em 14 de novembro, o DHPP solicitou a prisão preventiva dos dois suspeitos, mas o pedido foi negado pela Justiça. Com a conclusão do inquérito e o indiciamento por feminicídio, uma nova solicitação de prisão foi encaminhada.
O caso agora será analisado pelo Ministério Público, que decidirá se denuncia os investigados à Justiça. Se a denúncia for aceita, eles se tornarão réus e serão submetidos a julgamento.
Este trágico episódio evidencia a violência extrema motivada por transfobia e levanta discussões urgentes sobre segurança, direitos humanos e a necessidade de combater a discriminação de gênero com rigor e eficácia.