Nesta quinta-feira, 20 de novembro de 2025, o Brasil celebra o Dia da Consciência Negra em um momento de reflexão sobre os avanços conquistados e os desafios ainda presentes na luta contra o racismo estrutural. A data marca a morte de Zumbi dos Palmares, símbolo da resistência negra no país.
Conquistas históricas e reconhecimento
O presidente da Fundação Cultural Palmares, João Jorge Santos Rodrigues, avalia que houve avanços extraordinários nos últimos 60 anos em termos de igualdade racial no Brasil. Em entrevista à Agência Brasil, Rodrigues destacou que as comemorações do Dia da Consciência Negra demonstram a evolução na construção de uma sociedade mais democrática.
Entre as principais conquistas citadas pelo dirigente estão:
- Implementação das cotas raciais
- Criação do Ministério da Igualdade Racial
- Proteção aos territórios quilombolas demarcados
Rodrigues celebrou especialmente o legado de importantes lideranças do movimento negro, como Abdias Nascimento e Lélia Gonzalez, cujas lutas foram fundamentais para esses avanços. Abdias Nascimento foi escritor, dramaturgo, artista plástico, professor e ativista dos direitos civis, enquanto Lélia Gonzalez se destacou como intelectual, autora, professora e antropóloga, sendo referência nos estudos de gênero, raça e classe.
Racismo sistêmico: um crime permanente
Apesar dos progressos, o presidente da Fundação Palmares fez um alerta importante sobre a persistência do racismo sistêmico no país. Rodrigues caracterizou o racismo brasileiro como distinto do praticado em outras nações como Estados Unidos, África do Sul, Índia ou Austrália.
"É um racismo sistêmico, um crime continuado, sofisticado e permanente", afirmou Rodrigues. "Ele vai encontrando fórmulas de evitar que o negro esteja vivo para usufruir dessas ações afirmativas. É o caso das chacinas no Rio de Janeiro, na Bahia ou em São Paulo, onde há mortandade da população negra."
O dirigente enfatizou que a população negra, que soma 113 milhões de pessoas no Brasil - tornando o país a terceira maior população negra do mundo, atrás apenas de Nigéria e Etiópia - não está pedindo nada que não seja devido. "Nós construímos esta Nação com trabalho, com suor, com sangue", declarou.
Serra da Barriga e reparações históricas
Um dos pontos destacados por Rodrigues foi o papel da Fundação Cultural Palmares, fundada em 22 de agosto de 1988, na preservação da memória afro-brasileira. A instituição tem entre suas missões a proteção e valorização da Serra da Barriga, local do maior e mais duradouro quilombo das Américas - o Quilombo dos Palmares, situado na cidade de Palmares, em Alagoas.
O local abriga o Parque Memorial Quilombo dos Palmares, espaço dedicado à memória, resistência e cultura afro-brasileira. Rodrigues lamentou que entre 2018 e 2022 a Fundação ficou seis anos sem realizar atividades celebrativas ao Dia da Consciência Negra na Serra da Barriga.
O feriado nacional do Dia da Consciência Negra foi instituído pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva com apoio das ministras Anielle Franco (Igualdade Racial) e Margareth Menezes (Cultura). Para Rodrigues, essa conquista permite pautar a causa da justiça e da igualdade de oportunidades.
"Edificar a memória do povo brasileiro não é uma tarefa simples", refletiu o presidente da Fundação Palmares, "porque envolve a memória das mulheres, dos indígenas, da população negra, dos catadores, dos participantes das revoltas de Canudos e de Malês, por exemplo. É tudo que foi ocultado e foi tratado pela política como esquecimento."
Educação como caminho para avanços
A secretária-executiva do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial (CNPIR), Larissa Santiago, compartilha da avaliação positiva sobre os avanços em relação à igualdade racial, destacando especialmente o papel da educação.
"A gente tem conseguido discutir sobre igualdade racial com mais clareza, capilaridade", afirmou Larissa. "Acho que as pessoas, hoje, entendem o que significa igualdade racial e conseguem discutir mais sobre esse tema, sobre racismo, enfrentamento a racismo."
Ela atribui essa evolução ao avanço nas políticas educacionais, com a consolidação e ampliação das leis de cotas nas universidades e no serviço público. "Significa que a gente tem uma presença. É claro que não é o ideal, e a gente está trabalhando para que isso consiga avançar mais, mas existe, de fato, e é notória a participação e a presença das pessoas negras nas universidades, nos cursos federais e técnicos."
Como consequência positiva, Larissa destacou o aumento de professores negros, que têm condições de trazer para seus alunos a história e as perspectivas de raça, classe e gênero.
Desafios persistentes na saúde e segurança
Apesar dos avanços, a secretária-executiva do CNPIR admitiu que o Brasil ainda enfrenta muitos desafios na área de igualdade racial. Como um país de dimensões continentais com maioria de população negra espalhada por todo o território, entre os principais obstáculos estão garantir acesso à saúde plena e segurança pública para todas as pessoas.
"Eu imagino que, sendo a política de igualdade racial uma política transversal, a gente tem desafios nas diferentes áreas, nos diferentes espectros das políticas públicas", explicou Larissa. "E saúde e segurança são duas políticas da maior importância para alcançar, na ponta, a nossa população."
O Dia da Consciência Negra de 2025 se configura, portanto, como uma data de celebração das conquistas, mas também de reconhecimento dos graves desafios que ainda precisam ser superados para que o Brasil se torne verdadeiramente uma nação igualitária e justa para sua população negra.