A sessão da Câmara Municipal de Óbidos, no oeste do Pará, na última terça-feira (3), foi palco de uma denúncia grave e emocionada. A vereadora Clara Barbosa (MDB), mulher negra e a mais jovem parlamentar da história do município, subiu à tribuna para relatar publicamente que é vítima de injúria racial e violência política. Os ataques, segundo ela, partem de Márcio Roberto Franco Soares, conhecido como Márcio Belamita, assessor lotado no gabinete do prefeito Jaime Silva (MDB).
Discurso emocionado e denúncia formal
Em um relato carregado de indignação, Clara Barbosa detalhou o impacto dos ataques sofridos, principalmente através de publicações nas redes sociais. Ela citou expressões pejorativas e racistas utilizadas pelo servidor, como "A encardida que não é Clara".
"Me sinto violentada e ferida", declarou a parlamentar. "É um sentimento de indignação, frustração e revolta. Sou uma mulher jovem que entrou na política com esperança de promover políticas públicas, especialmente para as mulheres. É inadmissível que, em pleno século XXI, o racismo continue tão presente".
A vereadora foi enfática ao diferenciar liberdade de expressão de agressão: "Devemos lembrar que liberdade de expressão jamais pode ser confundida com liberdade para agressão". Clara Barbosa já havia encaminhado a denúncia ao Ministério Público, onde foi ouvida e tem um procedimento em andamento. Diante de novos ataques, ela usou a tribuna para manifestar sua revolta e informou que também comunicará o caso ao Ministério Público Eleitoral, para investigação por violência política de gênero e raça.
Réplica do acusado e repúdio institucional
No mesmo dia da denúncia na Câmara, o assessor Márcio Belamita gravou um vídeo para as redes sociais abordando o assunto. No material, ele assume a autoria dos textos que mencionam a vereadora, mas nega ter cometido crime de racismo.
"Quero reiterar a todos que me ligaram desde ontem, que eu estou tranquilo em relação às acusações... Eu tenho certeza que não cometi nenhum crime de racismo, até porque minha publicação não fala sobre cor de pele", afirmou. Belamita disse confiar na Justiça e que exercerá seu direito de defesa.
Após a publicização do caso, diversas instituições emitiram notas de repúdio. A Procuradoria da Mulher da Assembleia Legislativa do Pará (Alepa) manifestou solidariedade à vereadora e reafirmou o compromisso com os direitos das mulheres e o combate à violência política.
A Câmara Municipal de Óbidos também se posicionou, declarando veemente repúdio aos atos e afirmando que "não tolera, não compactua e não silenciará diante de qualquer forma de racismo, misoginia, violência política de gênero ou atentado à honra".
Silêncio da prefeitura e dimensão nacional
O MDB Mulher Nacional emitiu nota criticando a postura da gestão municipal. O texto destaca que a ausência de um posicionamento oficial da Prefeitura de Óbidos tem causado forte repercussão, pressionando o governo local e levantando questionamentos sobre a condução interna do episódio.
Clara Barbosa afirma que as ofensas têm sido recorrentes há meses, principalmente no Facebook, com o uso de termos racistas e pejorativos para desqualificar e humilhar sua atuação política. Ela enquadra o caso não apenas como injúria racial, mas também como violência política contra a mulher. Caso se comprove que o servidor usou seu cargo público para os ataques, ele também poderá responder a processo disciplinar.
A vereadora se diz determinada a levar o caso até o fim, buscando uma punição exemplar para que situações semelhantes não se tornem rotina na política de Óbidos. O caso, inicialmente local, agora ganha dimensão nacional, colocando em evidência os desafios do combate ao racismo e à violência de gênero nas instituições públicas.