O ex-presidente Jair Bolsonaro permanecerá em prisão preventiva após decisão judicial tomada durante audiência de custódia realizada no domingo (23). A decisão da magistrada ocorreu mesmo após o político relatar sofrer episódios de paranoia e alucinação decorrentes do uso combinado de medicamentos.
Relato sobre violação da tornozeleira
Durante a audiência, Bolsonaro admitiu ter tentado abrir sua tornozeleira eletrônica após experimentar um episódio que descreveu como "paranoia" e "alucinação". Segundo o registro oficial da sessão, o ex-presidente declarou ter agido "movido por temor e sensação de perseguição, decorrentes do uso concomitante de medicamentos".
Em seu depoimento, Bolsonaro revelou que chegou a acreditar que o dispositivo de monitoramento poderia conter um aparelho de escuta. Essa suspeita teria motivado sua tentativa de interferir no equipamento usando ferro quente, conforme admitiu à diretora de administração penitenciária. No entanto, ele negou qualquer intenção de fuga.
Medicamentos utilizados pelo ex-presidente
O ex-presidente informou fazer uso de dois medicamentos específicos: pregabalina, indicada para tratamento de dores crônicas neuropáticas, e sertralina, antidepressivo amplamente prescrito para depressão e transtornos de ansiedade.
Especialistas consultados explicaram que a sertralina pertence à classe de inibidores seletivos da recaptação de serotonina, aumentando a disponibilidade dessa substância no cérebro para regular humor, sono e ansiedade. Já a pregabalina atua diminuindo a intensidade dos sinais de dor que chegam ao cérebro.
Opinião de especialistas sobre os efeitos
O psiquiatra Luiz Sperry, formado pela USP, considerou a sertralina como "um dos medicamentos mais seguros da psiquiatria moderna", com poucos efeitos adversos. Ele explicou que a combinação com pregabalina é comum na prática clínica e costuma ter baixo potencial de interação.
No entanto, o psiquiatra Fábio Gomes de Matos e Souza, professor da Universidade Federal do Ceará, ponderou que em doses muito elevadas a sertralina pode desencadear a rara síndrome serotoninérgica, que em situações extremas pode estar associada a alucinações.
Marcel Fúlvio Padula Lamas, coordenador de Psiquiatria do Hospital Albert Sabin, acrescentou que episódios de desorganização mental gerados por medicamentos são raros, mas podem ocorrer em pessoas com vulnerabilidade a quadros psicóticos ou com histórico familiar de transtornos mentais.
Os especialistas concordaram que, embora teoricamente possível, a ocorrência de pensamentos paranoides ou alterações de percepção atribuíveis especificamente à combinação desses dois medicamentos é considerada improvável na prática clínica.