COP30: Cruzada contra o meio ambiente e pressão por ações climáticas
COP30: cruzada contra meio ambiente e urgência climática

A COP30 entra em sua fase decisiva marcada por negociações tensas e expectativas moderadas, com uma condução brasileira que surpreende pela eficiência. Para Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, os primeiros dias da conferência representaram um "milagre", mas o risco de retrocessos agora aumenta significativamente.

Negociações críticas e pautas em jogo

O ambiente inicialmente positivo criado pela habilidosa condução do governo brasileiro agora enfrenta desafios substanciais. Quatro pautas consideradas conflituosas estão sendo discutidas em uma sala especial, com negociadores trabalhando contra o relógio para encontrar consenso até o prazo estabelecido.

"O luxo do tempo que existe dentro da conferência não existe mais na vida real", afirma Astrini, destacando a desconexão entre o ritmo das negociações e a urgência da crise climática vivida por comunidades vulneráveis, especialmente povos indígenas.

Adaptação como pauta central

A adaptação às mudanças climáticas representa o coração desta COP, sendo considerada o DNA da conferência. No entanto, existem tentativas de alguns países de postergar decisões cruciais para a COP32, em Adis-Abeba, o que poderia significar um significativo retrocesso nas ambições climáticas globais.

Paralelamente, corre a terceira trilha de negociações: o mapa do caminho para o fim dos combustíveis fósseis e do desmatamento, proposta apresentada pelo presidente Lula. Esta iniciativa representa um desejo coletivo de atacar o principal problema climático e pode avançar independentemente do restante das discussões.

Indígenas e a urgência da realidade

As manifestações indígenas durante a conferência trouxeram à tona uma dimensão frequentemente negligenciada nas salas de negociação: a urgência da realidade climática. Enquanto dentro da COP o clima é discutido em relatórios e artigos, para essas comunidades ele se manifesta através de rios secando, caça desaparecendo e pessoas sendo expulsas de seus territórios.

"Existe um descompasso enorme entre o tempo das negociações e o tempo da vida real", reforça Astrini, destacando que as respostas da conferência estão se distanciando cada vez mais do necessário.

Financiamento e quebra de confiança

O financiamento climático continua sendo um dos maiores obstáculos para o progresso das negociações. Promessas não cumpridas por mais de uma década, somadas ao desmonte de acordos na COP de Baku, criaram um problema duplo: falta de recursos e quebra de confiança entre os países.

"Para ter acordo, você precisa de confiança. Para ter ação, você precisa de confiança. E para implementar ações, precisa de recursos", explica Astrini, alertando que esta questão pode paralisar não apenas as negociações atuais, mas também as futuras COPs.

Empresas e greenwashing

A atuação de empresas, especialmente do agronegócio, recebe críticas contundentes. "Muitas empresas não fazem greenwashing, elas enganam mesmo", afirma o ambientalista. Ele cita exemplos concretos: na pecuária, promessas de rastreamento da cadeia não implementadas há 15 anos, e na soja, a moratória sob judicialização com apoio de setores produtivos.

O alerta é claro: compromissos assumidos durante a COP precisam ser consistentes com as práticas adotadas durante todo o ano.

China e a contradição climática

A China apresenta um perfil contraditório nas discussões climáticas. O país entrega mais do que promete, mas promete pouco, com metas consideradas ainda muito baixas para sua representatividade nas emissões globais (entre um quarto e um terço do total).

"É o país que mais desenvolve tecnologia limpa e também o que mais polui e mais abre fábricas de carvão", descreve Astrini, enfatizando que qualquer objetivo climático global só será atingido se a China assumir liderança e realizar sua lição de casa de forma radical.

Impacto Trump e petroleiras

A eleição de Donald Trump nos Estados Unidos representa um impulso enorme para o que Astrini caracteriza como "uma cruzada contra o meio ambiente dentro da COP30". As grandes petroleiras, que têm responsabilidade direta na eleição do republicano, according to the activist, travam acordos, dificultam resoluções e colocam dúvidas sobre a ciência climática.

Os retrocessos já são visíveis: retirada de dados científicos do ar, corte de fontes de financiamento e cancelamento de projetos bilionários de energia renovável. "Pessoas já estão morrendo por causa da crise climática — e essa política faz com que morram mais", alerta o secretário-executivo do Observatório do Clima.

Mínimo aceitável e próximos passos

Para Astrini, o mínimo aceitável como resultado da COP30 inclui a aprovação de temas já maduros, como adaptação, transferência de tecnologia e gênero, além de um mandato claro para desenhar o mapa do caminho do fim dos fósseis e do desmatamento.

Como ações prioritárias para os próximos 12 meses, ele destaca duas iniciativas inseparáveis: avançar na adaptação e no mapa do caminho para o fim dos combustíveis fósseis. "Uma diz como vamos nos adaptar ao problema que já existe; a outra, como vamos controlar a causa", explica.

Os países ricos devem ser os primeiros a agir, conforme define o anexo 1 das responsabilidades climáticas. Enquanto países como o Brasil não dependem de financiamento externo para cumprir suas promessas, muitas nações em desenvolvimento precisam desses recursos e não podem ser deixadas para trás.