Pressão internacional sobre cortes de energia renovável no Brasil
O fenômeno conhecido como "curtailment" - corte de energia devido ao excesso de geração renovável - ganhou destaque internacional nos bastidores da COP30 em Belém, no Pará. Durante a Cúpula dos Líderes, o presidente francês Emmanuel Macron fez um pedido direto ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre uma medida que afeta empresas europeias no setor energético brasileiro.
O pedido de Macron e a reunião emergencial
Segundo fontes que acompanham a agenda energética, Macron solicitou pessoalmente a Lula que não vete uma emenda da MP 1.304 que trata do ressarcimento às empresas que sofrem perdas financeiras com os cortes de energia. A preocupação do líder francês está focada nas empresas de seu país que investiram em energia renovável no Brasil e podem enfrentar prejuízos significativos sem compensação.
Na tarde de quinta-feira (13), o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, fez um deslocamento emergencial de Belém para Brasília para se reunir com Lula. Entre os temas discutidos estava justamente a definição sobre os vetos na medida provisória. O presidente tem até 24 de novembro para tomar sua decisão final.
Interesses internacionais em jogo
A França não é o único país preocupado com o impacto financeiro dos cortes, mas tem sido o mais vocal na defesa de seus investidores. Cinco fontes com conhecimento das discussões confirmaram que vários países com investimentos em energia renovável no Brasil acompanham com apreensão o desfecho da questão.
O governo Macron está especialmente atento aos investimentos da TotalEnergies, que detém 34% da Casa dos Ventos, uma das principais desenvolvedoras de projetos eólicos no país. Este negócio faz parte do portfólio de descarbonização da companhia francesa, que mantém uma relação complexa com o Estado francês enquanto enfrenta pressões para acelerar sua transição energética.
O valor da controvérsia
As estimativas sobre os prejuízos variam significativamente entre os diferentes atores do setor. A Abrace, que representa grandes empresas de energia, calcula que as perdas com o curtailment de 2023 até o final deste ano podem chegar a R$ 7 bilhões. Este valor seria suficiente para adicionar aproximadamente 3% de aumento na conta de luz dos consumidores brasileiros.
Já a Abeeólica, representante do setor eólico, afirma que as empresas aceitariam receber R$ 3,8 bilhões em compensação, abrindo mão de parte das perdas. A associação argumenta que os recursos sairiam de um mecanismo da CCEE que faz compensações do mercado livre, mas técnicos da Aneel contestam esta versão, afirmando que tais recursos pertencem aos consumidores e exigem aprovação do Congresso.
A origem do problema
Enquanto a discussão sobre os vetos segue acirrada, o setor não resolve a causa fundamental do problema: o excesso de oferta de energia para pouca demanda. Esta situação é sustentada pelo avanço da geração nos telhados, conhecida como micro e minigeração distribuída.
Dados do banco BTG ilustram a dimensão do desafio. Até setembro, os cortes afetaram 20,4% da geração eólica e impressionantes 34,1% da geração solar, bem acima dos 23,8% do trimestre anterior e dos 16,5% registrados no terceiro trimestre do ano passado.
O impasse representa um teste importante para o equilíbrio entre a atração de investimentos estrangeiros em energia renovável e a proteção dos consumidores brasileiros contra aumentos na tarifa de energia.