
O cheiro de cinzas impregna o ar em Alcínópolis. Uma névoa espessa, que mais parece um véu de luto, cobre a paisagem que antes exibia o verde vibrante do Cerrado. O fogo chegou sem pedir licença — e quando partiu, deixou para trás um rastro de destruição que beira o inacreditável.
Nove mil hectares. Tente imaginar isso: são aproximadamente nove mil campos de futebol reduzidos a cinzas. O Parque Estadual das Nascentes do Rio Taquari, uma das joias ambientais de Mato Grosso do Sul, praticamente desapareceu sob as chamas.
Uma batalha contra o tempo
Os brigadistas trabalham há dias — e eu me pergunto quantas noites de sono perderam nessa guerra desigual contra o fogo. Equipes do Corpo de Bombeiros, do Instituto Meio Ambiente do Pantanal (Imap) e até voluntários se revezam numa corrida contra o relógio. O cansaço aparece nos olhos vermelhos, nas roupas sujas de fuligem, nas mãos calejadas que não param de lutar.
O prefeito Dalmy Crisóstomo da Silva não teve alternativa. Na última sexta-feira, assinou o decreto de situação de emergência. É a formalização do que todos já sabiam: a situação fugiu do controle.
O que se perdeu além das árvores?
Mais do que números em um relatório, o que ardeu nessas terras foi parte do patrimônio natural de todos nós. O parque abriga nascentes cruciais — inclusive as do Rio Taquari, que é praticamente a veia que alimenta parte do Pantanal. O fogo não queimou apenas mato; queimou vida, queimou futuro.
E o pior? Ainda não há uma resposta definitiva sobre o que iniciou esse inferno. Especula-se sobre causas naturais — afinal, estamos no período de seca extrema — mas também não se descarta a mão humana, seja por descuido ou intenção.
Enquanto escrevo isso, me vem à mente uma pergunta que não quer calar: quantos desastres assim precisaremos testemunhar até que a proteção ambiental deixe de ser discurso e vire ação concreta?
O que acontece em Alcínópolis hoje é um alerta que ecoa muito além das fronteiras de Mato Grosso do Sul. É um grito de socorro do Cerrado que não podemos mais ignorar.