BBC em crise: diretores renunciam após polêmica com documentário sobre Trump
BBC em crise após documentário polêmico sobre Trump

A BBC, emissora pública britânica, enfrenta uma de suas maiores crises institucionais após a renúncia de seus dois principais executivos devido a um documentário polêmico sobre Donald Trump. O diretor-geral Tim Davie e a presidente executiva da BBC News, Deborah Turness, apresentaram suas demissões no sábado, dia 8 de novembro, em meio a acusações de manipulação editorial.

A polêmica do documentário Panorama

O programa Panorama, exibido uma semana antes das eleições norte-americanas de 2024, apresentou uma edição controversa de um discurso de Donald Trump proferido em 6 de janeiro de 2021, data do ataque ao Capitólio. A montagem do vídeo sugeria que o então presidente incentivava seus apoiadores à violência, dizendo: "Nós vamos até o Capitólio e eu estarei lá com vocês. Lutaremos. Lutaremos como demônios".

Entretanto, o discurso original revelava uma mensagem completamente diferente. Trump havia afirmado: "Nós vamos até o Capitólio e nós vamos apoiar os nossos corajosos senadores e congressistas". A frase sobre "lutar como demônios" foi proferida 54 minutos depois na gravação original, em um contexto distinto.

Repercussão imediata e renúncias

As denúncias sobre a manipulação editorial foram publicadas pelo Telegraph em um artigo escrito por Michael Prescott, ex-consultor externo da BBC. O texto expunha preocupações sobre a imparcialidade da emissora e desencadeou uma crise que culminou nas renúncias dos principais executivos.

Samir Shah, presidente do Conselho de Administração da BBC, emitiu um comunicado afirmando que "Tim foi um excelente diretor-geral nos últimos cinco anos", mas enfrentou "uma pressão persistente que o levou a tomar esta decisão". Shah classificou o dia das demissões como "um dia triste para a BBC".

Trump comemora e ameaça ação judicial

Donald Trump não perdeu tempo para celebrar as demissões. Em sua rede social Truth Social, o presidente americano escreveu: "Os altos cargos da BBC, inclusive Tim Davie, o chefe, estão se demitindo ou sendo demitidos porque foram apanhados 'manipulando' meu excelente discurso de 6 de janeiro".

Trump foi além e enviou uma carta à BBC ameaçando mover ação judicial contra a emissora. A BBC confirmou o recebimento da correspondência e informou que "vai analisá-la e responder na devida altura".

Pedido de desculpas público

Nesta segunda-feira, o presidente do conselho da BBC pediu desculpas publicamente e admitiu um "erro de julgamento" na edição do discurso de Trump. Em carta ao presidente da comissão parlamentar de Cultura e Mídia, Samir Shah reconheceu que "a forma como o discurso foi editado deu a impressão de um apelo direto à ação violenta".

Crise de credibilidade e relatório interno

A publicação de um relatório interno da BBC com críticas ao serviço de notícias da emissora reacendeu acusações de parcialidade que vão além do caso Trump. O documento, revelado pelo The Daily Telegraph, apontou diversas irregularidades na conduta jornalística da corporação.

Entre as denúncias estão:

  • Parcialidade na cobertura do conflito Israel-Palestina pela BBC Árabe
  • Falta de equilíbrio na cobertura de temas transgênero
  • Diferenças substanciais entre versões em árabe e inglês da mesma notícia

O relatório documentou que uma pessoa que defendeu que judeus deveriam ser "queimados como Hitler fez" apareceu 244 vezes como convidado no canal BBC Árabe em 18 meses. Outro convidado que descrevia israelenses como "menos que humanos" participou de 522 programas no mesmo período.

O futuro da BBC

A crise atual representa o ápice de uma sequência longa de tensões internas e externas que a emissora pública britânica enfrenta há anos. A nomeação do novo diretor-geral será feita pelo Conselho de Administração da BBC, composto por dez membros não executivos e quatro executivos.

Embora o governo britânico não participe diretamente do processo de seleção, ele mantém influência sobre a emissora através da carta da BBC, elaborada pelo governo, que define sua missão pública. A atual carta vence em 31 de dezembro de 2027.

Enquanto isso, defensores da BBC alegam que a emissora está sendo alvo de um esforço coordenado de forças de direita para prejudicar sua credibilidade. O caso levanta questões fundamentais sobre o futuro do jornalismo público e os desafios da imparcialidade em um cenário político polarizado.