O ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal, confirmou publicamente pela primeira vez a existência de uma autoridade com foro privilegiado entre os investigados no esquema de comercialização de decisões judiciais no Superior Tribunal de Justiça. A revelação ocorre em meio a movimentações nos bastidores do poder em Brasília.
Os detalhes da investigação
O caso, revelado originalmente pela revista VEJA em outubro de 2024, investiga a participação de um ministro do STJ em um esquema organizado para vender sentenças na segunda mais alta corte do país. As suspeitas recaem sobre transações financeiras regulares entre o magistrado e um dos primeiros investigados por mercadejar despachos.
A rede de negociatas envolvia o lobista Andreson Gonçalves, o advogado Roberto Zampieri - assassinado a tiros em Cuiabá no final de 2023 - além de diferentes assessores e operadores que alegavam ter trânsito no tribunal.
O ministro suspeito já apresentou explicações para as transferências de dinheiro, afirmando que se tratava de repasses de parte de seus vencimentos para um terceiro, com o objetivo de pagar contas cotidianas.
Como funcionava o esquema
De acordo com as investigações da Polícia Federal, o mecanismo de corrupção operava através do vazamento antecipado de rascunhos de votos dos ministros. Esses documentos, chamados de minutas, eram produzidos por assessores integrantes da quadrilha exatamente nos termos encomendados por Andreson Gonçalves.
O lobista recebia os documentos vazados e entrava em contato com Zampieri para informar o custo da compra do despacho e incumbir o advogado de coletar os valores. Após o pagamento da propina, a decisão se materializava com a assinatura do ministro em questão e o voto era contabilizado no sistema interno de processos do tribunal.
A maioria dos processos alvo de suspeita envolve disputas no Mato Grosso, incluindo casos relacionados ao gigante de carnes JBS, contendas em propriedades rurais e empresas com dificuldades financeiras.
Reações no STF e STJ
Ministros do Supremo Tribunal Federal reagiram com cautela à decisão de Zanin de encaminhar ao procurador-geral Paulo Gonet o inquérito sigiloso. A postura do relator foi descrita como "zelosa" por colegas da corte, que evitaram críticas públicas.
Enquanto isso, alguns ministros do STJ defendem que as investigações avancem rapidamente, mesmo que o resultado final possa representar um custo político para a instituição. Eles veem com ressalvas as sondagens realizadas junto ao procurador-geral por parte de ministros do STF.
Zanin deixou clara a existência da autoridade com foro em um despacho contra a retirada do caso da Corte, pedido recorrente das defesas dos investigados. Ele afirmou explicitamente que "a investigação apura, em procedimento específico, potencial participação de autoridade com prerrogativa de foro neste Supremo Tribunal Federal".
O caso é investigado em um inquérito confidencial separado dos primeiros que chegaram ao gabinete de Zanin, que apuravam a possível participação de assessores dos ministros Og Fernandes, Isabel Gallotti e Nancy Andrighi na comercialização de votos. Todos os envolvidos negam qualquer participação em ilegalidades.