Kaja Kallas responde a Trump: 'EUA ainda são maior aliado da Europa'
Chefe da diplomacia da UE responde a críticas de Trump

A chefe da diplomacia da União Europeia, Kaja Kallas, reagiu neste sábado, 6 de julho, às duras críticas contidas na nova estratégia de segurança nacional dos Estados Unidos, divulgada na véspera. Em declarações no Fórum de Doha, no Catar, Kallas reconheceu que "há muitas críticas, mas acho que algumas delas são verdadeiras", referindo-se ao documento americano que pinta um futuro sombrio para o continente europeu.

Estratégia americana gera desconforto na Europa

O documento estratégico da administração do presidente Donald Trump, tornado público na sexta-feira (5), causou mal-estar entre os aliados tradicionais dos EUA. A retórica, alinhada com a filosofia "América em primeiro lugar", sugere que a Europa enfrenta uma "perspectiva de extinção civilizacional" e questiona sua confiabilidade como parceira a longo prazo.

O texto, descrito como um "corolário Trump" à Doutrina Monroe de 1823, visa reafirmar a preeminência americana no Hemisfério Ocidental. Originalmente concebida para combater a interferência europeia nas Américas, a doutrina foi historicamente usada para justificar intervenções militares dos EUA na América Latina.

Além de retratar os europeus como enfraquecidos, a estratégia critica abertamente as políticas de imigração do bloco e medidas de combate ao discurso de ódio e desinformação, vistas por Washington como formas de "censura".

Kallas pede autoconfiança, mas reafirma aliança

Em sua resposta, a alta representante da UE admitiu falhas. "Se você observar a Europa, ela tem subestimado seu próprio poder em relação à Rússia", afirmou Kallas durante um painel de discussão. "Deveríamos ter mais autoconfiança", completou.

No entanto, ela foi enfática ao reafirmar a importância da parceria transatlântica: "os EUA ainda são nosso maior aliado". Kallas ponderou que, embora não haja concordância em todos os temas, o princípio da união deve prevalecer. "Somos os maiores aliados e devemos permanecer unidos", declarou.

A diplomata estoniana também criticou o papel dos Estados Unidos nas negociações de paz para a guerra na Ucrânia, que completa mais de três anos. Ela se referiu ao plano americano que, segundo relatos, envolveria concessões territoriais à Rússia. "Impor limitações e pressão à Ucrânia, na verdade, não nos traz uma paz duradoura", alertou Kallas. "Se a agressão for recompensada, veremos isso acontecer novamente, e não apenas na Ucrânia ou [na Faixa de] Gaza, mas em todo o mundo."

Reações europeias: de rejeição veemente a comparações com Putin

A Comissão Europeia rejeitou as acusações. A principal porta-voz, Paula Pinho, negou que o bloco minasse a liberdade política ou a soberania, mas evitou comentários mais profundos, alegando que ainda não havia analisado o documento integralmente.

Na Alemanha, as reações foram variadas. O ministro do Exterior, Johann Wadephul, reconheceu os EUA como o "aliado mais importante" da OTAN, mas afirmou que questões sobre liberdade de expressão "não fazem parte das discussões da aliança" e que ninguém precisava dar conselhos aos europeus sobre o tema.

Já Jürgen Hardt, porta-voz de política externa da coalizão conservadora CDU/CSU, foi mais contundente. Ele comparou o tom do documento americano ao do presidente russo, Vladimir Putin. "A avaliação do presidente dos EUA sobre a Europa é muito tendenciosa... ou às vezes soa como Putin falando sobre a Europa", disse.

Em contraste, Markus Frohnmaier, parlamentar do partido de ultradireita Alternativa para a Alemanha (AfD), elogiou a estratégia, chamando-a de "um choque de realidade na política externa da Europa".

As outras frentes da estratégia Trump: América Latina, Oriente Médio e China

O documento estratégico não se limita à Europa. Ele delineia uma postura mais agressiva nas Américas, incluindo ataques militares a supostos barcos de narcotráfico no Caribe e no Pacífico oriental, e avalia uma possível ação militar contra o regime de Nicolás Maduro na Venezuela.

No Oriente Médio, a estratégia propõe abandonar o que chama de "experimento equivocado" de importunar nações sobre suas tradições, fortalecendo laços e vendo a região como um local para parcerias e investimentos.

Em relação à China, a administração Trump busca um "reequilíbrio" nas relações bilaterais, combatendo a postura agressiva de Pequim em relação a Taiwan.

A divulgação desta estratégia marca uma ruptura clara com a política externa do antecessor democrata, Joe Biden, e coloca as relações transatlânticas em um novo e desafiador patamar de realinhamento e questionamentos mútuos.