
Não é todo dia que a floresta ganha assento na Casa de Machado de Assis. Nesta quinta (14), o Amazonas celebrou como nunca: Milton Hatoum, aquele que tece palavras como rede de pescar memórias, foi eleito para a ABL. E olha que história – um menino de Manaus que virou referência da nossa literatura.
Quem acompanha sua trajetória sabe: Hatoum não escreve livros, ele costura universos. Com uma precisão de ourives, mistura cheiros da Amazônia com dramas familiares que doem de tão reais. Dá pra sentir o suor dos personagens, o peso das ausências...
Dois rios e muitas fronteiras
Nascido em 1952 na capital amazonense (aquele calor úmido que gruda na pele), o escritor tem sangue libanês correndo nas veias. Essa mistura explosiva – árabe com amazônida – explica muita coisa. Suas histórias transitam entre Beirute e Manaus como quem muda de sala, criando pontes onde outros veriam abismos.
Formado arquiteto (sim, ele quase seguiu outro caminho!), resolveu trocar plantas baixas por enredos complexos. Fez mestrado na Sorbonne, mas foi nas margens do Rio Negro que encontrou sua verdadeira matéria-prima.
Obras que marcaram época
- Relato de um Certo Oriente (1989) – Seu debut que já chegou dando sopapo literário. Venceu o Jabuti e mostrou que nascia um narrador diferente.
- Dois Irmãos (2000) – Esse aqui dói. A saga dos gêmeos Yaqub e Omar virou até minissérie e continua sendo devorado por novas gerações.
- Cinzas do Norte (2005) – Outro Jabuti na estante. Retrato cruel e poético de uma Manaus em transformação.
Ah, e não podemos esquecer de Órfãos do Eldorado (2008) – uma novela que cabe na palma da mão, mas com a densidade de uma árvore centenária. Ou A Noite da Espera (2017), primeiro volume de sua trilogia mais recente.
Um lugar entre os imortais
A cadeira 23 da ABL (antes ocupada por ninguém menos que José de Alencar) nunca pareceu tão contemporânea. Hatoum chega trazendo na bagagem não apenas seu talento, mas toda uma região muitas vezes invisibilizada nos círculos literários.
"É como se a Amazônia finalmente ganhasse voz naquele salão", comentou uma professora de Letras da UFAM, com os olhos brilhando. De fato, sua eleição representa mais que um mérito pessoal – é um reconhecimento da diversidade da nossa cultura.
Enquanto prepara o discurso de posse (imagina o nervosismo!), Hatoum continua sendo aquele sujeito discreto que prefere as livrarias pequenas aos holofotes. Mas agora, quer queira quer não, tornou-se símbolo de uma literatura que pulsa entre o local e o universal.
E aí, já marcou na agenda? A cerimônia promete ser daquelas pra guardar na memória – assim como seus livros.