O chef que conquistou a COP30 com sabores da Amazônia
À frente de uma das missões mais desafiadoras da COP30 em Belém, o chef paraense Saulo Jennings assumiu a responsabilidade de alimentar cerca de 1.700 convidados do evento climático mundial. Reconhecido por sua expertise em valorizar ingredientes amazônicos, Jennings comanda uma equipe impressionante de mais de 200 profissionais de cozinha.
Do kitesurf aos fogões: uma trajetória inusitada
A história de Saulo Jennings com a gastronomia começou de forma bastante peculiar. Antes de se tornar chef, ele vivia uma realidade completamente diferente. "Quando fiquei desempregado, comecei a dar aulas de kitesurf no Tapajós", revelou o profissional. "Velejar no Tapajós, na Amazônia, é incrível, né?" complementou.
O que começou como um simples lanche oferecido aos alunos após as aulas de kitesurf se transformou no pontapé inicial de sua carreira gastronômica. "Com o tempo percebi que eles gostaram mais da comida do que da aula de kite", contou com bom humor. O boca a boca entre seus alunos consolidou essa nova trajetória profissional.
Maniçoba e filhote: os protagonistas do cardápio
Para o almoço das autoridades presentes na COP30, Saulo Jennings optou por manter a tradição paraense. O prato principal escolhido foi a maniçoba, uma receita tradicional que exige um preparo minucioso e paciente.
"A estrela mesmo do dia é um prato que às vezes tem até um pouco de polêmica ou de críticas, que seria um prato 'muito feio'", brincou o chef durante entrevista à equipe do Fantástico, que visitou a cozinha do evento para conhecer os bastidores do cardápio.
Saulo explicou detalhadamente o processo de preparo da maniçoba: "Para o preparo, deve-se triturar a folha da mandioca-brava, chamada de maniva. Depois, deve ser hidratada e cozida por sete dias, para receber as proteínas". O prato leva charque, bacon, panceta, calabresa e toucinho, sendo comparado pelo chef a uma feijoada em termos de sabor e riqueza.
Além da maniçoba, outro destaque do cardápio é o peixe filhote, espécie bastante presente na culinária paraense e que tem uma ligação especial com o chef.
Compromisso com ingredientes locais e produtores
Jennings mantém um forte vínculo com os ingredientes regionais, especialmente com o peixe filhote. Essa conexão chegou a gerar uma situação inusitada durante a conferência, quando recebeu uma proposta para preparar um jantar totalmente vegano para um príncipe visitante.
"Recusei: 'Mas eu não cozinho também para ninguém se for sem peixe'", afirmou o chef com convicção. E explicou o motivo de sua posição: "Porque eu acho que o peixe é meu propósito hoje. Porque muitas pessoas vivem desse peixe. Só do nosso restaurante são mil famílias que fazem manejo sustentável".
Os ingredientes utilizados na COP30 têm origem no tradicional Mercado Ver-o-Peso, onde Saulo seleciona pessoalmente pescados, frutas e ervas que compõem seus pratos. É também nesse mercado que ele adquire o filhote, peixe que considera essencial em sua cozinha.
Gastronomia como expressão cultural e diplomática
Nascido e criado às margens do rio, Saulo Jennings carrega consigo uma filosofia de vida que reflete em seu trabalho: "A gente aprendeu que tudo que era bom vinha do rio", relembra sobre sua infância.
Essa mesma crença o motiva a servir pratos regionais para lideranças internacionais sem qualquer receio. "Isso é alta gastronomia. Isso é gastronomia internacional. Isso é cultura alimentar", defende com paixão.
Nos bastidores da COP30, as panelas do chef foram amplamente aprovadas. Quem provou, raspou o prato, demonstrando o sucesso da empreitada gastronômica.
O reconhecimento da culinária como ferramenta diplomática
A comitiva brasileira enxerga a culinária como parte fundamental da imagem do país no exterior. Aloizio Mercadante, presidente do BNDES, reforçou essa visão: "Eu sempre falei, né, que eu acho que a comida brasileira tinha que realmente chegar a um nível de ser uma comida gastrodiplomática".
Para Mercadante, é através da comida que muitas pessoas constroem suas lembranças e percepções sobre um país, destacando a importância estratégica da gastronomia nas relações internacionais.
A humildade e o conhecimento profundo sobre seus ingredientes marcam a trajetória de Saulo Jennings, que brinca sobre suas habilidades: "Eu brinco que cozinhar, eu até posso saber pouco. Mas eu sei muito sobre os ingredientes que eu uso". Uma filosofia que está conquistando paladares e corações na COP30.