
Há um mês e meio, o silêncio tomou conta da vida de quem conhecia a estudante trans desaparecida em Ilha Solteira. Agora, o rio parece sussurrar histórias que ninguém consegue decifrar — enquanto dezenas de pescadores, com seus barcos desgastados pelo tempo, varrem as águas numa missão que já virou questão de honra.
"A gente conhece cada curva desse rio como a palma da mão", diz o pescador João da Silva, de 54 anos, enquanto ajusta as redes. Seus olhos cansados escondem uma determinação que surpreende: "Não vou parar enquanto não acharmos ela. Ponto final."
O sumiço que virou quebra-cabeça
Naquele dia comum de junho, ninguém imaginaria que a rotina da cidade mudaria tanto. A estudante — cujo nome a família pediu para não divulgar — saiu de casa como sempre fazia. Só que dessa vez, o destino parece ter engolido seus passos.
As buscas começaram tímidas, mas hoje são uma operação complexa:
- Equipes terrestres revirando matas fechadas
- Pescadores cobrindo 15km do rio Paraná
- Até drones entrando na jogada — tecnologia e tradição de mãos dadas
E enquanto isso, na cidade, os muros ganham cartazes desbotados pela chuva. Rostos sérios em mercados e bares sussurram teorias, mas a verdade? Continua boiando nas águas barrentas.
Além da busca: o que fica
Não é só um corpo que procuram. É dignidade. É resposta. É o direito básico de uma família chorar seu luto — se é que ainda há esperança. A delegada responsável pelo caso, que pediu para não ser identificada, soltou uma frase que ecoa na redação: "Cada minuto conta, mas cada preconceito atrapalha."
E ela tem razão. Quantas pessoas desaparecem sem o mesmo alarde? Sem a mesma mobilização? A pergunta fica no ar, pesada como o calor do interior paulista.
Enquanto o sol se põe sobre o rio, os barcos voltam vazios. Mas amanhã? Amanhã tentam de novo. Porque em Ilha Solteira, pelo menos por enquanto, desistir não está no vocabulário de ninguém.