Deputado mineiro enfrenta possível investigação por violação de ordem judicial
O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) pode enfrentar complicações na Justiça após descumprir decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, ao utilizar telefone celular durante visita ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O episódio ocorreu na última sexta-feira (21) e foi flagrado pela TV Globo.
Nas redes sociais, o parlamentar criticou a emissora pela filmagem e afirmou que não teve intenção de violar a decisão de Moraes, tomada em agosto, que proíbe visitantes do ex-presidente de "utilizar celulares, tirar fotos ou gravar imagens". Nikolas alegou não ter recebido comunicação prévia sobre a restrição.
Repercussões imediatas e notícia-crime
O fato já gerou consequências para Bolsonaro, com Moraes intimando seus advogados para que expliquem a utilização do aparelho. Horas após a visita de Nikolas, o ex-presidente tentou romper a tornozeleira eletrônica usando um ferro de solda, o que resultou na determinação de sua prisão preventiva no sábado (22).
Após a divulgação das imagens, a deputada Erika Hilton (PSOL-SP) apresentou uma notícia-crime ao STF. O documento alega existir "fortes indícios" de que os atos praticados por Nikolas não apenas violaram ordem judicial, mas também sugerem participação ativa na articulação que antecedeu a tentativa de fuga de Bolsonaro.
A representação sustenta que há indícios suficientes do crime de desobediência à ordem legal de funcionário público, previsto no artigo 330 do Código Penal, com pena de 15 dias a seis meses, além de multa. Também cita a possibilidade de aplicação do artigo 351 do mesmo código, sobre promover ou facilitar a fuga de pessoa legalmente presa, com detenção de seis meses a dois anos.
Especialistas divergem sobre consequências jurídicas
Segundo Luisa Ferreira, professora de direito penal da FGV-SP, o flagra de Nikolas usando o celular pode trazer implicação jurídica, mas considera o cenário pouco provável. Ela entende que o objetivo da proibição judicial é evitar que Bolsonaro use terceiros para acessar o aparelho.
"Apenas o fato de o deputado ter mexido no celular no mesmo dia em que o ex-presidente tentou tirar a tornozeleira não é indício suficiente de crime", avalia a especialista. Para ela, o pedido de apreensão do aparelho é "frágil e temerário" se não houver outros indícios que associem Nikolas a uma tentativa de fuga.
Já Ricardo Gueiros, professor de direito da Ufes, argumenta que o episódio não deve trazer consequência penal. Ele explica que o crime que melhor se enquadraria no caso é o 349-A do Código Penal, sobre ingressar com aparelho telefônico, sem autorização legal, em estabelecimento prisional.
"Se o Nikolas tivesse entrado em um estabelecimento prisional típico, o crime estaria categoricamente manifesto", afirma Gueiros. No entanto, ele ressalta que "no direito penal, há uma restrição a qualquer tipo de interpretação que venha a ser extensiva demais".
Marcelo Crespo, coordenador do curso de direito da ESPM, apresenta visão diferente. Para ele, o parlamentar pode ter incorrido no crime de desobediência, se de fato estava ciente da proibição. "Se tinha ciência dessa decisão, tem que responder por desobediência. Mas a questão é: ele tinha essa ciência?", questiona.
Crespo entende que, se o parlamentar sabia da vedação, é necessário que as autoridades instaurem um inquérito para apurar a conduta. Sobre o pedido de apreensão do celular, o especialista afirma fazer sentido no contexto, envolvendo pedido de vigília que, segundo autoridades, poderia facilitar a fuga de Bolsonaro.
Nesta quarta (26), a bancada do PSOL na Câmara dos Deputados também protocolou um pedido de investigação à PGR (Procuradoria-Geral da República), ampliando a pressão sobre o caso.