Uma decisão histórica na Justiça inglesa marca novo capítulo na busca por justiça pelas vítimas do rompimento da barragem do Fundão, em Mariana, considerado o maior desastre ambiental do Brasil. Após oito anos de batalha legal, a condenação da gigante mineradora BHP abre caminho para a fase de quantificação das indenizações.
Sentimento de justiça para famílias das vítimas
Gelvana Rodrigues, mãe de Thiago, um dos 20 mortos na tragédia de 2015, expressou alívio com a condenação. "Meu filho agora vai poder descansar em paz, porque a justiça vai ser feita", declarou emocionada. A mulher perdeu o filho de apenas 7 anos quando a lama de rejeitos invadiu comunidades naquele fatídico 5 de novembro.
Em coletiva organizada pelo escritório Pogust Goodhead, que representa os atingidos na ação em Londres, advogados detalharam que o processo já avança para a chamada "fase 2", dedicada exclusivamente à quantificação dos danos. Esta etapa vem sendo preparada paralelamente à espera da sentença e deve ganhar ritmo acelerado agora.
Diferenças processais entre Brasil e Inglaterra
Os representantes legais enfatizaram uma diferença crucial nos sistemas judiciais: a BHP não tem direito automático de apelação. Para recorrer, a empresa precisa de autorização específica da High Court ou da Corte de Apelação inglesa, e essa permissão pode ser concedida apenas para pontos específicos do julgamento, não para reabrir todo o caso.
Enquanto a mineradora anuncia que tentará apelar, a Justiça inglesa já marcou audiência de gestão do caso para 17 e 18 de dezembro de 2025, quando serão ajustadas datas e procedimentos. O julgamento sobre os danos está agendado para início de outubro de 2026, com duração estimada de seis meses.
Posicionamento dos municípios atingidos
O prefeito de Mariana, Juliano Duarte (PSB), destacou que a condenação na Inglaterra coroa "uma luta de oito anos da ação inglesa e dez anos da ruptura da barragem". Ele e o ex-prefeito Duarte Júnior reforçaram que a cidade optou por não aderir ao acordo de R$ 170 bilhões firmado no Brasil, criticando a priorização de União e Estado em detrimento de municípios e vítimas.
"Nós perdemos 927 milhões de reais em cinco anos da minha gestão. O que foi oferecido ao município de Mariana não é justo", afirmou Duarte Júnior. Ambos consideram que a decisão da Justiça inglesa confirma que manter a disputa internacional foi o "caminho correto" para buscar reparação adequada.
Pressão sobre a Justiça brasileira
Do lado das comunidades, Mônica dos Santos, de Bento Rodrigues, e outros representantes veem a sentença inglesa como instrumento de pressão sobre a Justiça brasileira. Na esfera criminal, os réus do caso Mariana, incluindo executivos da Samarco, Vale e BHP, foram absolvidos em 2023 pela Justiça Federal por falta de provas suficientes para responsabilização penal individual.
"Eu sabia que o resultado não seria outro. Hoje só veio a confirmação, e espero que essa decisão ajude no processo de responsabilização penal aqui no Brasil", disse Mônica. Os representantes confirmaram que há recurso em curso no Brasil contra a absolvição dos executivos.
O rompimento da barragem do Fundão, controlada pela Samarco - joint venture entre Vale e BHP -, liberou mais de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração que destruíram comunidades inteiras, poluíram o Rio Doce e causaram danos ambientais irreparáveis até o litoral do Espírito Santo.