
Imagine pegar um avião zero quilômetro e cruzar oceanos para entregá-lo do outro lado do mundo. Soa como sonho? Para Thiago Bacega, é rotina. Esse campo-grandense de 32 anos vive uma daquelas profissões que a gente nem imagina que existem - ele é piloto entregador de aeronaves.
Não, não é entrega por drone nem nada disso. Estamos falando de jatos multimilionários, daqueles que as companhias aéreas compram e precisam buscar na fábrica. E alguém tem que pilotá-los até seu novo lar. "As pessoas sempre me perguntam: mas como assim você entrega avião?", ri Thiago. "É exatamente isso: eu busco o avião na fábrica e levo até onde o comprador quer."
Do cerrado para o mundo
O caminho até aqui não foi exatamente convencional. Thiago começou - pasme - como motoboy. "Andei muito tempo de moto por Campo Grande, sabe? Entregando documento, encomenda leve. Hoje entrego avião." A transição veio através de muito estudo e horas incontáveis de simulador. "Aviação é assim: ou você é filho de piloto ou tem que ralar muito. Eu fiquei com a segunda opção."
Que história, né? O cara que uma vez enfrentou o trânsito caótico da Afonso Pena agora desvia de furacões no Caribe. A vida prega umas dessas.
Os bastidores que ninguém vê
Mas calma que não é só glamour. A profissão tem seus perrengues - e alguns são bem inusitados. "Já fiquei 40 horas esperando em um aeroporto na Ásia porque tinha uma burocracia errada", conta. "Outra vez, precisei explicar para autoridades de um país que não falo inglês que eu estava apenas de passagem, não era dono do jato."
Os preparativos para cada missão são minuciosos. Thiago me explica que cada voo requer:
- Planejamento de rota detalhadíssimo - e não é no Google Maps
- Estudo meteorológico de cada trecho do percurso
- Documentação para sobrevoar países (sim, precisa de permissão)
- Plano B, C e D para emergências
"Tem voo que são 20 horas seguidas no ar. Sozinho. É você, o avião e o oceano lá embaixo."
A solidão dos céus e as recompensas
Falando em solidão... como é passar dias sozinho cruzando continentes? "No começo era estranho, hoje até gosto. É meu escritório flutuante." Mas ele confessa: "Saudade de casa bate, principalmente quando vejo o pôr do sol sobre o Pacífico e penso: nossa, meus amigos iam adorar ver isso."
As recompensas, no entanto, são únicas. "Já pousei em mais de 50 países, vi culturas que nem sabia que existiam. E o melhor: sempre volto para o Mato Grosso do Sul. Aqui é minha base, meu porto seguro."
Pergunto se ele se considera sortudo. "Sortudo? Talvez. Mas principalmente teimoso. Persegui esse dream desde os 18 anos quando juntei meu primeiro salário para fazer aula de voo."
Para quem sonha em seguir
Para os jovens que se encantaram com a história, Thiago é realista: "Não é profissão para todos. Você passa mais tempo longe de casa do que nela. Tem que gostar de solitude e ser extremamente organizado."
Mas o conselho dele? "Se é seu sonho, vai atrás. Eu era apenas um motoboy de Campo Grande. Hoje entrego aviões na Ásia, Europa, onde for preciso. O céu é literalmente o limite."
Quem diria, hein? Enquanto a gente se preocupa com trânsito na hora do rush, tem um sul-mato-grossense por aí evitando turbulência sobre o Atlântico. O mundo é mesmo cheio de histórias incríveis - algumas bem acima das nuvens.