Um ano após tragédia com 39 mortes na BR-116, destroços e negligência permanecem
Um ano após tragédia na BR-116, destroços seguem no local

Marcas da Tragédia Ainda Visíveis Após Um Ano

Exatamente 365 dias se passaram desde a madrugada fatídica de 21 de dezembro de 2024, mas o cenário no quilômetro 285 da BR-116, no distrito de Lajinha em Teófilo Otoni, ainda guarda as feridas abertas da tragédia que ceifou 39 vidas. Uma visita recente da reportagem ao local revelou um panorama de abandono: peças estruturais do ônibus destruído e pertences pessoais dos passageiros continuam espalhados à beira da rodovia e na mata lateral, nunca tendo sido recolhidos.

Entre os objetos esquecidos, fragmentos de um quadro que seria entregue como presente de Natal simbolizam a interrupção brutal de dezenas de histórias. O local exato da colisão, onde um bloco de granito se soltou de uma carreta e atingiu em cheio um coletivo da empresa EMTRAM, permanece cercado por destroços de metal, um testemunho silencioso da violência do impacto.

Do Acidente ao Crime: Negligência Grave e Júri Popular

A violência extrema do cenário, descrita por socorristas como uma "cena de guerra", foi posteriormente traduzida em termos jurídicos. O Ministério Público denunciou o motorista da carreta e o dono da transportadora por homicídio doloso com dolo eventual. A acusação sustenta que ambos assumiram conscientemente o risco de matar ao ignorarem normas elementares de segurança.

A investigação, conduzida pelo delegado Amaury Albuquerque, listou oito fatores cruciais que caracterizam a conduta criminosa:

  • Excesso de peso da carga de granito.
  • Excesso de velocidade no trecho de serra.
  • Condução sob influência de álcool e drogas.
  • Desrespeito aos períodos obrigatórios de descanso.
  • Modificações estruturais não autorizadas no semirreboque.
  • Pneus desgastados e falhas graves na amarração das pedras.
  • Motorista dirigia com a Carteira Nacional de Habilitação suspensa.
  • Fuga do local do acidente sem prestar qualquer socorro.

Para o delegado, a combinação de sobrepeso e amarração inadequada tornou o desastre inevitável. "Foi um comportamento criminoso", afirmou Albuquerque. Agora, o futuro dos réus será decidido por sete cidadãos em um Júri Popular, um processo que busca responsabilizar não apenas o condutor, mas toda a gestão da empresa pela negligência.

Trauma Coletivo e Promessas de Segurança Não Cumpridas

Enquanto a Justiça segue seu curso, a comunidade que vive às margens do km 285 convive diariamente com o trauma e a sensação de insegurança. Daurinha dos Santos Raicher, moradora local que presenciou o movimento de ambulâncias através de câmeras de segurança, relata que a rotina não melhorou.

Ela denuncia que o fechamento de passagens laterais na ponte, uma suposta medida de segurança, na verdade aumentou o perigo para pedestres, obrigando-os a cruzar a rodovia correndo. "As carretas continuam descendo em alta velocidade", alerta. A promessa de instalação de radares para controlar a velocidade no declive foi apenas parcialmente cumprida, com um equipamento de 60 km/h instalado a 500 metros do local do acidente.

A Polícia Rodoviária Federal reforça que a ausência desse radar no momento da tragédia foi um fator crítico. O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) e a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) têm melhorias estruturais e novos postos de pesagem previstos apenas para os próximos anos, dentro do cronograma de concessão da rodovia.

Até lá, os fragmentos de metal à beira da pista e o processo judicial permanecem como lembretes amargos da negligência que transformou o km 285 da BR-116 em um marco de luto e impunidade. O trauma, como define Daurinha, se tornou coletivo para todos que residem na região.