Uma cobertura jornalística se avalia tanto pelas informações que apresenta quanto pelas intenções que deixa transparecer. Quando uma denúncia vira tema recorrente e é amplificada por todos os veículos de um mesmo grupo, o caso deixa de ser um simples furo para se tornar uma campanha articulada. É essa a análise que se impõe diante da insistência das Organizações Globo em atacar o ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes.
Da denúncia à campanha: a estratégia do repeteco
O ponto de partida foi uma reportagem da jornalista Malu Gaspar, conhecida por seu extenso uso de fontes anônimas. A matéria tratava de um contrato entre o escritório da esposa de Moraes e o Banco Master. Por si só, uma informação de grande impacto e que merecia apuração. No entanto, o que chamou a atenção foi a sequência de desdobramentos.
A denúncia inicial foi rapidamente replicada e requentada, ganhando espaço não apenas no jornalismo da TV Globo e da GloboNews, mas também em outros braços do grupo, como a rádio CBN, onde Carlos Alberto Sardenberg chegou a mencionar a possibilidade de impeachment do ministro. Montar uma campanha dessa amplitude, sem checagem robusta das informações, demonstra uma intenção política explícita, conforme apontam observadores.
O timing suspeito e a grande questão
O momento escolhido para a ofensiva levanta dúvidas. Os julgamentos dos crimes de 8 de janeiro estão na fase final. Uma vez concluídos, a exposição midiática de Moraes tende a diminuir. Portanto, a motivação não parece ser imediatamente eleitoral ou vinculada a um caso específico. A pergunta central, então, é: qual o interesse das Organizações Globo em "detonar" Alexandre de Moraes?
Especialistas apontam quatro temas sensíveis no STF que poderiam explicar o movimento. Vamos a eles.
Os quatro temas quentes do Supremo
Tema 1: O combate ao orçamento secreto. A investigação sobre as organizações criminosas que se apropriaram de verbas sigilosas envolve cerca de 90 parlamentares e está sob relatoria do ministro Flávio Dino. Enfraquecer o STF fortaleceria o Centrão e atrapalharia essas apurações, mas não parece ser um interesse direto da Globo.
Tema 2: O enfraquecimento do bolsonarismo. A emissora historicamente se opõe a Jair Bolsonaro e sua família. Um ataque a Moraes, que é alvo constante da extrema-direita, não se alinha a esse objetivo. Pelo contrário, poderia beneficiar aliados bolsonaristas.
Tema 3: O contra-ataque ao poder excessivo de Moraes. Esta hipótese também não se sustenta. A Globo foi uma das principais promotoras do poder concentrado do ex-juiz Sérgio Moro durante a Lava Jato. A empresa não tem histórico de ser contraponto a figuras poderosas, a menos que seus interesses sejam contrariados.
A hipótese mais concreta: a Lava Jato
Tema 4: As investigações sobre a Lava Jato. Aqui as suspeitas ganham corpo. Duas possibilidades se apresentam. A primeira seria uma lealdade eterna da Globo à operação, com a qual se comprometeu profundamente, inclusive com seus jornalistas mais famosos. No entanto, a empresa é conhecida por paixões pragmáticas, e a Lava Jato hoje é vista como uma mancha em sua história.
Sobra a segunda e mais plausível hipótese: o temor de que as investigações em curso nos arquivos da 13ª Vara Federal e na chamada "caixa amarela" revelem detalhes incômodos sobre a parceria entre a Lava Jato e a Globo. O avanço dessas apurações poderia expor o nível de cooperação e troca de informações entre procuradores, juízes e certos setores da mídia.
Não se trata de uma certeza, mas de uma análise de probabilidades baseada no padrão de comportamento do grupo midiático. A Globo optou por confinar o debate ao registro operacional, evitando aprofundar as implicações institucionais nacionais. Enquanto isso, o debate público "escalou" em outros veículos. É questão de tempo para que as razões reais dessa campanha coordenada venham totalmente à tona.