As eleições presidenciais no Chile reservaram uma das maiores surpresas da política latino-americana neste domingo, 16 de novembro de 2025. O candidato centrista Franco Parisi, do Partido de la Gente (PDG), alcançou uma expressiva votação de 19% dos votos, garantindo o terceiro lugar no primeiro turno e superando candidaturas tradicionais.
O fenômeno Parisi e o discurso do centro
Com 58 anos, Parisi construiu uma campanha baseada em um discurso populista de centro, posicionando-se contra os extremos políticos. Sua mensagem "nem fascistas nem comunistas" ressoou entre eleitores desiludidos com a política tradicional, atraindo aqueles que buscavam uma alternativa ao cenário polarizado.
O candidato investiu pesado em presença nas redes sociais e apresentou propostas que abrangiam desde segurança pública, incluindo combate ao "terrorismo" e defesa das fronteiras, até sustentabilidade e acesso à saúde em "tempo hábil".
Após os resultados, Parisi enviou um recado direto aos finalistas: "Não dou carta branca a ninguém; isso é desrespeitoso. Tenho más notícias para o candidato Kast e para a candidata Jara: conquistem os votos, ganhem o apoio do povo nas ruas. Preciso de gestos deles. O PDG não precisa de favores".
Os polêmicos caminhos até a surpresa eleitoral
A trajetória política de Parisi, no entanto, não foi livre de controvérsias. Em 2013, durante sua primeira candidatura à Presidência, ele incluiu gastos com cuecas, meias e sapatos da marca Hugo Boss no relatório de despesas eleitorais, totalizando US$ 580.400.
Três anos depois, em 2016, enfrentou acusações de assédio sexual por uma estudante no Texas. Já em 2021, o centrista conduziu sua campanha eleitoral diretamente dos Estados Unidos, impedido de entrar no Chile devido a uma dívida milionária de pensão alimentícia com sua ex-esposa.
O segundo turno entre extremos
O primeiro turno definiu que a disputa final em 14 de dezembro será entre a candidata comunista Jeannette Jara, que obteve 26% dos votos, e o ultradireitista José Kast, com 24%. O resultado reflete a profunda polarização que divide o país.
Jeannette Jara, filiada ao Partido Comunista desde a adolescência, foi líder estudantil e sindical. Atuou como subsecretária da Previdência Social no governo de Michelle Bachelet e posteriormente como ministra do Trabalho no governo de Gabriel Boric. Suas propostas incluem renda mínima, subsídios para empresas, modernização da polícia, construção de cinco novas prisões até 2033 e mobilização das Forças Armadas na proteção das fronteiras.
José Kast, que encontra inspiração em Donald Trump e Javier Milei, começou sua carreira política como deputado do partido de direita União Democrata Independente (UDI). Em 2019, fundou o Partido Republicano. Católico, pai de nove filhos e nostálgico dos tempos de Pinochet, ele defende bandeiras contra o aborto e critica o que chama de "ditadura gay". Para o segundo turno, promete criminalizar a imigração irregular, expulsar "todos" os indocumentados e construir valas e muros nas fronteiras.
Desafios de governabilidade
Carlos Malamud, pesquisador do Real Instituto Elcano, alerta sobre os riscos institucionais: "Um segundo turno entre Kast e Jara intensifica a polarização entre a 'ameaça comunista' e os alertas de um retorno ao autoritarismo. Independentemente do que aconteça nessas eleições, a governabilidade e as instituições democráticas estão em jogo".
Apesar de ter saído à frente no primeiro turno, Jara enfrenta sérios riscos na disputa final. Pesquisa da AtlasIntel divulgada no final de outubro indica que Kast deve ser eleito com diferença de cinco pontos percentuais. Cerca de 13% do eleitorado permanece indeciso, mas a tarefa de conquistá-los será árdua - 54% dos entrevistados têm visão negativa sobre Jara, contra 40% que a veem com bons olhos.
O Chile se encontra, portanto, diante de uma encruzilhada histórica, com o centro demonstrando força significativa através de Parisi, mas incapaz de evitar o confronto final entre extremos opostos que promete definir os rumos do país nos próximos anos.