A divulgação dos arquivos relacionados ao caso do bilionário Jeffrey Epstein, condenado por crimes sexuais, está gerando um efeito contrário ao esperado dentro da base de apoiadores do ex-presidente americano Donald Trump. Em vez de acalmar os ânimos, a publicação de documentos com extensos trechos suprimidos na sexta-feira, 19 de dezembro, alimentou a frustração e expôs tensões internas no movimento Make America Great Again (Maga).
Revolta nas Redes e Críticas à Transparência
A procuradora-geral dos Estados Unidos, Pam Bondi, aliada de Trump, tentou defender a transparência da administração em um post na rede social X no último fim de semana. No entanto, a reação dos usuários foi imediata e negativa, com muitos focando sua indignação justamente na forma como os arquivos de Epstein estão sendo tratados. Comentários acusando Bondi de "mentirosa" e de encobrimento foram massivos.
O cerne da insatisfação não são as fotos já conhecidas de figuras públicas com Epstein, como o ex-presidente Bill Clinton ou o músico Mick Jagger, mas o grande volume de informações censuradas nos documentos liberados. Durante a campanha eleitoral, Trump havia sugerido que apoiaria a divulgação total, e a própria Bondi afirmou em fevereiro que os arquivos estavam "sobre a minha mesa para análise". A expectativa criada tornou a divulgação limitada ainda mais decepcionante para parte de seus eleitores.
A Fragilidade da Nova Coalizão Maga
Especialistas apontam que o episódio revela uma fissura significativa na coalizão política de Trump. Joe Uscinski, professor da Universidade de Miami, destaca que muitos apoiadores do Maga são movidos por um profundo ceticismo em relação às instituições e acreditam em teorias conspiratórias, como as ligadas a QAnon, que envolvem tráfico sexual de crianças por elites.
"As pessoas não querem necessariamente que os documentos sejam divulgados. Elas querem documentos que confirmem aquilo em que já acreditam", afirma Uscinski. Essa base, que inclui eleitores mais jovens e atraídos por promessas específicas sobre o caso Epstein – chamados internamente de "ouvintes de Joe Rogan" pela chefe de gabinete de Trump, Susie Wiles –, demonstra uma lealdade mais a Trump do que ao Partido Republicano tradicional.
Uma pesquisa do Manhattan Institute mostrou que quase um terço dos apoiadores de Trump são "novos republicanos", com vínculo frágil com o partido. Pouco mais da metade desse grupo afirmou apoiar "com certeza" um candidato republicano nas eleições legislativas de 2026.
Silêncio Estratégico e Conflitos Internos
A tentativa de apaziguar esses eleitores incluiu um evento no Departamento de Justiça para influenciadores digitais conservadores, como Chaya Raichik (Libs of TikTok) e Jack Posobiec, que receberam pastas com documentos descritos como a "primeira fase" da divulgação. O material, porém, tinha pouco conteúdo novo, gerando mais irritação.
Curiosamente, após a última divulgação, muitos desses influenciadores mantiveram silêncio. Alguns, como Laura Loomer, afirmaram que os documentos isentam Trump, pedindo que a imprensa pare de focar no caso. Outros simplesmente não comentaram. Este silêncio foi notado e criticado por comentaristas de direita, alimentando disputas internas nas redes sociais.
No Congresso, as críticas foram mais diretas. A deputada republicana Marjorie Taylor Greene classificou a divulgação como "NÃO Maga". Já o congressista Thomas Massie, que liderou a iniciativa legislativa para liberar os arquivos, passou o fim de semana acusando o Departamento de Justiça e a procuradora-geral Bondi de violarem a lei, sugerindo até mesmo processá-la por desacato ao Congresso.
O vice-procurador-geral, Todd Blanche, prometeu a liberação de centenas de milhares de documentos adicionais até o final do ano. Independentemente do conteúdo, a forma como o caso Epstein está sendo manejado já se tornou um símbolo das tensões entre a velha guarda republicana e a nova base populista e conspiracionista de Trump, colocando à prova a coesão de seu movimento na reta final do ano.